Votar em Fernando Haddad é preciso !






























Ponta da Praia

Marcos Rolim (*)

Entre janeiro de 1999 e janeiro de 2003, durante o mandato que exerci como deputado federal, tive, por dever de ofício, de me encontrar muitas vezes com Jair Bolsonaro. Integrei a Comissão de Constituição e Justiça e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, tendo presidido essa última no ano de 2000. 

Bolsonaro participou muitas vezes das reuniões da Comissão de Direitos Humanos. Nunca apresentou uma única ideia ou projeto, nunca pretendeu sequer dialogar com os demais membros da Comissão. Sua presença, como agente provocador, se deu sempre para ofender pessoas, desprezar os relatos das vítimas e defender a ditadura e seus métodos.

Lembro de muitos episódios como, por exemplo, quando debatíamos iniciativas para a identificação de ossadas que poderiam ser de desaparecidos políticos, o que levou o deputado a dizer que “quem procura osso é cachorro”. Ele também fixou na porta de seu gabinete um cartaz com essa frase.

Lembro de quando aprovamos meu relatório sobre abusos sofridos por índias Yanomami, violadas sexualmente por soldados do Exército quase na fronteira com a Venezuela. Estive lá, com Davi Kopenawa Yanomami, uma das mais respeitadas lideranças indígenas do mundo, que foi o intérprete para a conversa que mantive com as índias. Ao saber que eu havia traduzido o relatório e remetido para ONGs em todo o mundo, Bolsonaro me chamou de “traidor da pátria” propondo o meu fuzilamento, em pronunciamento na tribuna. 

Muito antes, ele já havia proposto o fuzilamento de Fernando Henrique e recomendado a tortura de Chico Lopes, ex-presidente do Banco Central. 

As pessoas mudam. Muitas têm mesmo a virtude de aprender com seus erros, de amadurecer, de se tornarem mais cultas e, por decorrência, mais conscientes de suas próprias limitações. Viver com sentido exige a coragem para deslocar-se, para ver com outros olhos, para ser mais crítico conosco mesmos. Pensar é esse deslocar-se, essa busca pelo não sabido, esse acerto de contas consigo mesmo. Bolsonaro já era um parlamentar experiente naquela época, mas poderia ter mudado. Não mudou um centímetro.

Em 2014, na cerimônia na Câmara que inaugurava o busto em homenagem ao Deputado Rubens Paiva, barbaramente torturado e morto pela ditadura, ele montou uma confusão em meio aos presentes, gritando: – “Rubens Paiva teve o que mereceu, comunista desgraçado, vagabundo!”. Depois disso, cuspiu no busto, para o horror dos familiares de Paiva e perplexidade geral das autoridades presentes (veja a história contada pelo neto de Rubens Paiva aqui: https://goo.gl/ZNYHK1).

No último domingo, Bolsonaro fez um discurso (vamos chamar assim) transmitido de sua casa para a Av. Paulista onde milhares de apoiadores o ouviram. O pronunciamento é assustador. Feito sem teleprompter para amaciar a vocação de capitão do mato, Bolsonaro foi 100% Bolsonaro. Na overdose fascista, lá pelas tantas ele disse:
Petralhada, vai tudo vocês (sic) pra ponta da praia. Vocês não terão mais vez em nossa pátria porque eu vou cortar todas as mordomias de vocês. Vocês não terão mais ONGs para saciar a fome de mortadela de vocês. Será uma limpeza nunca visto (sic) na história do Brasil.
A ideia de uma “faxina ideológica” já havia sido anunciada desde seu último comício no Acre, antes do atentado, quando o candidato disse que os petistas seriam metralhados. 

Fiquei intrigado, entretanto, com a expressão “Vai tudo vocês pra ponta da praia”. 

Talvez o capitão tenha se empolgado com o fato de estar sendo ouvido por tanta gente e tenha deixado escapar uma expressão muito reveladora, como nos ato falhos observados por Freud. 

“Ponta da praia” teria sido uma gíria usada por militares para o destino de presos políticos que seriam mortos sob tortura na base militar da Marinha na Restinga de Marambaia, em Pedra Guaratiba, no Rio de Janeiro. Faz sentido. Não por acaso, Bolsonaro se refere aos problemas do Brasil sempre fixando temporalmente o que ocorreu “nesses últimos 30 anos”.

Nesses últimos 30 anos, o Brasil viveu em uma democracia. Com todas as suas fragilidades e limites, mas, ainda assim, uma democracia. Foi esse regime que permitiu que um defensor da ditadura e da tortura fosse candidato a presidente.

Bolsonaro é um adversário da democracia, um inimigo dos direitos humanos e um proponente da violência. Seu programa, seus pronunciamentos e sua história não permitem a menor dúvida a respeito disso. 

Se ele vencer as eleições, o que poderá construir em favor da democracia, das garantias fundamentais e da paz?


(*) Doutor e mestre em Sociologia e jornalista. Presidente do Instituto Cidade Segura. Autor, entre outros, de “A Formação de Jovens Violentos: estudo sobre a etiologia da violência extrema” (Appris, 2016)

Postado em Sul21 em 26/10/2018








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