Mostrando postagens com marcador cota. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador cota. Mostrar todas as postagens

10 anos da Lei de Cotas

 



Clique no link abaixo para ler :


10 anos da Lei de Cotas: as mudanças promovidas e a necessária manutenção








Lei de Cotas : Devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais



Icaro Vidal foi o primeiro aluno a ingressar em Medicina da UFba por meio de cotas, formou-se em 2011. Hoje é médico do Programa Saúde da Família da prefeitura de Salvador (Foto: Lucia Correa Lima/RBA)



Aristóteles, importante filósofo grego, dizia que devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. 

Este é o princípio da Lei de Cotas. O estudante negro, pobre, de escola pública, com família que luta para sobreviver, não tem como concorrer com quem frequentou as melhores escolas a vida toda, foi bem alimentado, teve vida cultural intensa. Eles são desiguais. Portanto, não dá para falar em meritocracia quando as pessoas que concorrerem a uma vaga na universidade, por exemplo, não partem do mesmo patamar. 

A escravidão foi abolida, mas as sequelas permanecem até hoje na nossa sociedade. As ações afirmativas tentam corrigir esta dívida histórica. A Lei de Cotas é o tema do Bom Para Todos.










Desempenho de cotistas fica acima da média




Mariana Mandelli - O Estado de S.Paulo

Estudos realizados pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e pela Universidade de Campinas (Unicamp) mostraram que o desempenho médio dos alunos que entraram na faculdade graças ao sistema de cotas é superior ao resultado alcançado pelos demais estudantes.

O primeiro levantamento sobre o tema, feito na Uerj em 2003, indicou que 49% dos cotistas foram aprovados em todas as disciplinas no primeiro semestre do ano, contra 47% dos estudantes que ingressaram pelo sistema regular.

No início de 2010, a universidade divulgou novo estudo, que constatou que, desde que foram instituídas as cotas, o índice de reprovações e a taxa de evasão totais permaneceram menores entre os beneficiados por políticas afirmativas.

A Unicamp, ao avaliar o desempenho dos alunos no ano de 2005, constatou que a média dos cotistas foi melhor que a dos demais colegas em 31 dos 56 cursos. Entre os cursos que os cotistas se destacaram estava o de Medicina, um dos mais concorridos - a média dos que vieram de escola pública ficou em 7,9; a dos demais foi de 7,6.

A mesma comparação, feita um ano depois, aumentou a vantagem: os egressos de escolas pública tiveram média melhor em 34 cursos. A principal dificuldade do grupo estava em disciplinas que envolvem matemática.

Postado no blog O Esquerdopata em 13/08/2012

O preconceito e a arrogância dos bonzinhos no debate sobre cotas


Os bonzinhos seguem fazendo sua parte para tornar o mundo pior. Numa canção inesquecível sobre a vida dos trabalhadores ingleses, John Lennon anotava: “assim que você nasce eles te fazem sentir-se pequeno…”

paulo moreira leite
Paulo Moreira Leite: “argumento do bonzinho é apenas arrogância fantasiada de caridade”.
A forma mais hipócrita de combater toda política pública de acesso dos brasileiros pobres às universidades consiste em dizer que os jovens de origem humilde não irão sentir-se bem em companhia de garotos de famílias abastadas, que puderam chegar lá sem auxílio de medidas do governo.
Por esse motivo, segue o raciocínio, iniciativas como cotas, pró-Uni e outras, iriam prejudicar até psicologicamente aqueles alunos que pretendem beneficiar, pois estes cidadãos se sentiriam diminuídos e inferiorizados ao lado de colegas cujas famílias frequentam universidades há várias gerações.
Vamos combinar que estamos diante de um recorde em matéria de empulhação ideológica. É possível discutir as cotas a partir de argumentos políticos, pedagógicos e assim por diante.
Mas o argumento do bonzinho é apenas arrogância fantasiada de caridade.
Num país onde a desigualdade atingiu o patamar da insania e da patologia, este raciocínio se alimenta de um desvio essencial. Consiste em considerar que um cidadão que não teve acesso a boas escolas desde o berço e encara o lado desagradável da pirâmide social logo depois de abrir os olhos é incapaz de raciocinar sobre sua condição e compreender que enfrenta dificuldades pelas quais não tem a menor responsabilidade como indivíduo mas como herdeiro de uma estrutura social desigual e injusta.
É aquela noção de quem acredita que as pessoas que se encontram nos degraus inferiores da pirâmide desconhecem a origem histórica material de suas dificuldades e, intimamente, se consideram “inferiores” aos demais. No fundo, se sentiriam culpadas por usufruir de um certo “privilégio” que os ricos, bem nascidos e instruídos podem dispensar — até porque o recebem por outros meios.
A vida real não é assim. Basta visitar escolas publicas e privadas que aplicam esses programas para descobrir que a maioria dos estudantes que se beneficiam de políticas compensatorias tem um desempenho igual ou até superior a seus colegas. Alguns dão duro como os demais. Outros batalham menos. Alguns fazem amigos. Outros encontram colegas que não querem ser amigos. É a vida de verdade, como se aprende até em filme sobre adolescentes americanos. A única pergunta relevante é saber se dentro de dez ou vinte anos o país estará melhor com cidadãos menos desiguais. Alguém tem alguma dúvida?
Mas os bonzinhos seguem fazendo sua parte para tornar o mundo pior. Numa canção inesquecível sobre a vida dos trabalhadores ingleses, John Lennon anotava: “assim que você nasce eles te fazem sentir-se pequeno…”
A mensagem dos bonzinhos é essa. Os filhos de pais pobres são tão pequenos que se sentem menores mesmo quando chegam à universidade. O melhor, então, é que sejam mantidos ao longe. Pode?
Postado no blog Pragmatismo Político em 13/08/2012

Em defesa das cotas “raciais” e contra os lacerdinhas



Por Juremir Machado da Silva
Não se pode fugir do passado. Assim como não é correto tapar o sol com a peneira em relação aos crimes da ditadura de 1964, não haveria como negar para sempre a dívida com os negros produzida pelos séculos de escravidão. Toda fortuna de mais de quatro gerações deve aos escravos. Num país capitalista democrático a educação é o caminho para acertar contas com o que ficou para trás. Ou se tem educação gratuita para todo mundo (França e outros países europeus) ou se tem educação gratuita para os mais carentes. O sistema universitário público brasileiro fez o contrário durante muito tempo: garantiu educação superior gratuita para os mais ricos. Especialmente nos cursos mais procurados como medicina.
É simples assim: costuma chegar primeiro quem sai primeiro.
O modelo do mérito, os melhores entram e não pagam, é um sistema de hierarquia social, um modo de reprodução da desigualdade, uma maneira de manter privilégios. Quando não há igualdade de preparação no ponto de partida, não há condições equivalentes de competição no ponto de ingresso, o vestibular. Sou totalmente favorável às cotas. Sempre há exceções: o menino pobre que supera todas as barreiras e conquista uma vaga improvável. O que é interessa é a média. A universidade pública gratuita para os mais ricos, por serem os “melhores”, é uma perversão, um efeito perverso da meritocracia.
Só tem uma maneira legítima de não precisar de cotas: bancar vagas gratuitas para todos os que atingirem determinada média. O resto é enrolação. Só que útil para alguns.
Até a controvérsia entre cotas sociais e cotas raciais é conversa fiada, coisa de quem quer tergiversar. Os negros, entre os pobres, são mais prejudicados que os brancos.
A elite branca, acostumada a ficar com as mais cobiçadas vagas das universidades públicas, com base nesse sistema de reprodução da desigualdades pelas diferenças sociais, econômicas e históricas de preparação, continua esperneando. Não é absurdo se propor um aumento das vagas destinadas às cotas. Enquanto o passivo persistir, será preciso enfrentá-lo com medidas fortes. Sem cotas, o acesso de certos grupos às universidades públicas brasileiras permaneceria o mesmo pelos próximos 500 anos.
É claro que os lacerdinhas, ideólogos da meritocracia com método pretensamente neutro e universal, vão continuar berrando. A meritocracia é um dispositivo de dominação baseado numa mentira: a igualdade de oportunidades. Vou repetir: não é porque todos respondem questão iguais, na mesma sala e na mesma hora, que há paridade no jogo. Essa é a ilusão da banca, o engano calculado para vender uma neutralidade falsa.
As cotas são um contraveneno contra o veneno da meritocracia estimulada como esporte de combate. A meritocracia transforma os derrotados em incompetentes ou preguiçosos. Grande parte simplesmente não pode treinar. Ainda existem aqueles que defendem a formação de elites, um ensino de elite, e lamentam a massificação do ensino superior. São ganidos de lacerdinhas inconformados com os novos tempos, uivos em defesa de uma época em decomposição, réquiens por um sistema de hierarquia social a caminho de tornar-se defunto. Os donos do poder, contudo, não morrem de boca fechada. Abrem o berreiro. Soltam o verbo, clamam por objetividade. Ai, ai, ai…
Raças não existem, o que existe é preconceito de cor.
Esse preconceito ganhou, ao longo do tempo, uma legitimação “racial”.
Aos se falar em cotas “raciais” se está, na verdade, defendendo uma compensação aos que, pela cor, foram prejudicados em nome de um preconceito dito racial.
A questão não é só de escola pública ou de pobreza, é de cor mesmo.
Há um lastro de pobreza intensa e falta de oportunidades derivado da cor.
Basta espiar os dados do IBGE para se ter certeza disso.
Tem muita gente querendo confundir as coisas.
É pura estratégia, jogada, malandragem.
Mérito é ganhar um jogo em que os competidores têm equivalência de preparação.
Meritocracia é ganhar um jogo em que só um dos competidores, favorecido no ponto de partida, pôde realmente se preparar. É, como se diz, jogo jogado.
Salvo quando dá zebra.
O mundo não é simples.
Tem sido simplificado.
Complexificar demais pode ser uma maneira de complicar e esconder as simplificações.
As cotas acarretam distorções.
O sistema, sem elas, é pura distorção.
A universidade pública branca gaúcha ainda não é suficientemente colorida.
O argumento em favor das cotas sociais, não raciais, é falacioso: por que os pobres poderiam receber uma compensação pelos prejuízos sofridos na competição e os negros ou índios, por terem sido prejudicados como negros ou índios, não?
A compensação pode se dar em relação a qualquer elemento historicamente comprovado como fato de discriminação, preconceito e prejuízo nas condições de disputa.
A cor, no Brasil, tem sido fator histórico de agravamento da pobreza e de prejuízo na competição pela ascensão social e por acesso a espaço de disputa.
Há um efeito inercial nos obstáculos impostos à cor.
A escravidão gerou um passivo que se disseminou, sob novas formas, ao longo do tempo, assumindo a característica de pobreza, embora sendo uma pobreza plus.
É puro sofisma dizer que negros pobres querem privilégios.
As cotas enfrentam privilégios dissimulados, ardilosos, permanentes.
A defesa das cotas unicamente sociais é uma artimanha predominantemente branca para não assumir o racismo ainda existente e não admitir a dívida histórica com negros e índios.
É uma negação parcial de culpa.
A universidade pública gaúcha pode mais.
Vai dar.
Para desespero dos lacerdinhas.

Postado no blog Juremir Machado da Silva em 21/07/2012 
Imagem inserida por mim



Sou cotista, mas meu irmão não vai ser



Sou cotista na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e gostaria de falar rapidamente sobre a minha história. Na verdade, sobre a história da minha família depois que eu ingressei no ensino superior. Estudei a vida toda na Escola Estadual Barão de Lucena, em Viamão, onde me formei no final de 2007. Meus pais não podiam pagar um curso pré-vestibular para eu me preparar para o próximo ano. Por isso, conversei com amigos, com primos, com ex-professores, tomei alguns livros emprestados e decidi estudar em casa. Graças às cotas, eu passei. Passei no vestibular para Jornalismo em 2009, na minha segunda tentativa.



Depois que entrei na faculdade, minha cabeça abriu, meu português melhorou e as pessoas ao meu redor são outras. Muitas pessoas que se dizem contra as cotas discutem se eu vou ser um bom profissional, se eu fui jogado para dentro da Universidade para resolver um problema sem solução hoje. Se eu sou a estopa que está tentando tapar um buraco negro. Muitos dizem que eu ter saído da Vila São Tomé, em Viamão, e agora ter acesso a bibliotecas, ter conhecido pessoas que mudaram minha vida, ser voluntário na Central Única das Favelas, estar vivendo em uma realidade jamais pensada pela maioria dos meus vizinhos… vou além: eu ter conhecido a Casa de Cultura Mario Quintana, poder ir ao cinema toda a semana, vivenciar experiências vistas como coisa de burguês onde moro e até conseguir juntar dinheiro para visitar meus amigos na Europa. Tudo isso por causa das cotas, de eu estar dentro da faculdade. Muitos dizem que isso não resolve o problema da nossa sociedade, da educação brasileira, de anos de descaso. Pois bem.



Muitos dos meus amigos não sabem, mas, até eu prestar vestibular, não tinha computador. Por estar no SPC, minha mãe pediu para nossa vizinha retirar no crediário um micro Compaq. Parcelado em doze vezes. Hoje, três anos e meio depois, escrevo todos os dias e trabalho com redes sociais – realidade que nem passava pela minha cabeça naquele momento.

Se eu seguisse o rumo dos meus amigos de infância – parceiros do esconde-esconde, do futebol no asfalto – seria cobrador, motoboy, profissões comuns onde moro. Muito dignas, diga-se. Minha mãe sentiria orgulho de mim da mesma forma. Mas, hoje, sinto um brilho diferente. Minha mãe não pensaria duas vezes em se endividar para bancar um cursinho pré-vestibular para o meu primo. Não pensaria duas vezes em abrir mão de um dinheiro juntado com esforço, há muito tempo, para investir em um novo computador para a minha irmã. Não pensaria duas vezes em apostar em mim se eu dissesse que eu cresceria. Ela acredita agora que podemos crescer. Eu pude. Meu primo pode. Minha irmã pode. Por que não?

Juliano Marchant, aluno cotista da UFRGS, durante #PosTV Cotas nas Universidades Brasileiras, em 29/04/2012

Meu primo de sete anos está na segunda série do ensino fundamental na mesma Escola Estadual Barão de Lucena. Hoje, olho para ele – ou ele me olha – e sinto, vejo, noto com toda a sinceridade que ele não precisará de cotas para ingressar no ensino superior. Meu primo vê uma nova realidade em sua volta. O “primo grande” dele está na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O primo dele faz Jornalismo. O primo dele vai ter diploma. Tudo isso, por causa das cotas.

Não é só a minha realidade, portanto. O meu ingresso na faculdade mudou a realidade de no mínimo três pessoas em volta. A medida paliativa, que não é a definitiva, com certeza, através de mim, vai resolver a vida do meu primo, da minha irmã.

Quatro anos após o começo da discussão no Supremo Tribunal Federal, as cotas foram mantidas – com o aumento para 50% de vagas, ainda. Os magistrados não olharam somente para mim. Olharam principalmente para o meu primo e para a minha irmã, lá na frente.


Postado no blog Sul21 em 13/06/2012

Sou a favor das cotas ...


13 de maio. dia da abolição da escravatura



E para os indígenas também!


Fotos de índios brasileiros


Bóris Casoy volta a mostrar seu preconceito latente


Por DiAfonso*

Palavras do Bóris Casoy [transcrição de áudio]:

O fato de as cotas terem sua constitucionalidade avalizada pelo STF não significa que o programa seja correto. Ao contrário, é um erro grave que, a pretexto de compensar crueldades históricas praticadas pelo Brasil escravocatra [sic], acaba incentivando o racismo latente na sociedade brasileira. A questão do acesso à universidade nada tem a ver com cor, raça ou etnia. É uma questão social e econômica, produto do lixo que é o ensino público aqui no Brasil. O que deve determinar ou não a entrada na universidade é, simplesmente, o mérito! [ver vídeo abaixo]

O âncora Bóris Casoy não tem idoneidade para falar de negro, de índio, de racismo, de cotas raciais ou de qualquer tema que esteja relacionado ao respeito pelo outro. Basta lembrar o seu lastimável comportamento no episódio envolvendo honrados trabalhadores. Para quem não se lembra, Bóris teceu comentários humilhantes sobre as sinceras felicitações de Ano Novo, dadas por dois garis [aqui]

Cabe, ainda, ressaltar as contradições na fala do apresentador. Se a questão do acesso à universidade está ligada a fenômenos socioeconômicos e se a educação pública é um lixo [nisso deve-se concordar com ele, não nesses termos], então por qual razão evocar o MÉRITO para o ingresso no ensino superior? Acaso, as "crueldades históricas praticadas pelo Brasil escravocatra [sic]" a que se refere o jornalista não deixaram um rastro de intolerância e preconceito na alma dos que têm a cor branca - a cor das elites?

A partir das contradições de sua palavras, Bóris apenas ratifica um preconceito que ele mesmo traz dentro de si, como ficou claro no caso dos garis.

Quem sabe um dia - quando o Brasil superar os problemas sociais e de exclusão que ainda precisam ser erradicados - não precisemos mais de cotas para negros, índios, pobres ou quem quer que seja?

Quem sabe, também, não precisemos mais de nefastos seres ancorando um telejornal como Bóris Casoy?

Vamos à luta [Como dizia Gonzaguinha]!


Artigo com base na postagem sobre Bóris, no Blog O Cachete, do Cumpadi Giovani de Morais.

*Editor-geral do Terra Brasilis.

Postado no blog Terra Brasilis em 28/04/2012
 Ícaro, primeiro aluno negro cotista de medicina da UFBA, recebe diploma


Apesar do DEM, dos Demétrios, dos Demóstenes, dos Dantas o vôo deste Ícaro foi pleno de realizações. Que história fantástica. Que venham muitos Ícaros.

Primeiro aluno de Medicina a entrar por cotas na UFBA recebe diploma
Por: Luana RibeiroCorreio da Bahia
06/01/2012



Ícaro começou Medicina na Ufba em 2005. Tornou-se ícone do sistema; aprovado em concurso para o Programa de Saúde da Família, já tem emprego garantido. Foto: Almiro Lopes
Em uma casa azul na Ladeira Manoel Faustino – mesmo nome de um dos líderes negros da Revolta dos Alfaiates, que em 2011 se tornou Herói da Pátria – Ícaro Luis Vidal, 24 anos, se apronta para o grande dia de sua vida. À noite, o primeiro estudante a ingressar pelo sistema de cotas no curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Ufba) se forma.
As trancinhas que a cabeleireira faz em seu black power têm dois motivos: um é poder vestir o capelo de formatura (chapéu usado na solenidade). O outro é a pressão de sua mãe, Raimunda Vidal dos Santos, 47, que acha que assim o filho fica mais bonito para a festa, realizada ontem à noite, no Centro de Convenções.
Ícaro começou o curso em 2005, quando a Ufba implantou o sistema de cotas. Hoje, a instituição reserva 2% das vagas para índio-descendentes e 43% para alunos que tenham todo o ensino médio em escolas públicas. Desses, 85% são para estudantes que se declararam pardos ou pretos.
Ao fim do 3º ano no Colégio da Polícia Militar, conciliado com o cursinho, Ícaro já tinha passado no meio do ano em Direito na Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs). “Assim, eu fiz a prova mais tranquilo”. Amiga de infância, Inês Costal, 24, lembra dele como aluno aplicado. “Sempre foi brilhante, era o CDF”, relata.

Orgulho

Ícaro atribui o desempenho à sua criação. “Ele nunca me deu trabalho, mas sempre cobrei. A média do colégio era 8, mas eu exigia 9”, lembra a mãe. O rigor deu resultado. “Tenho orgulho dos meus filhos”, afirma ela, incluindo a filha Ísis Carine dos Santos, 25, que mês que vem se forma em Engenharia Química, também na Ufba.
Ontem, na formatura, dona Raimunda via o sonho realizado e vibrava num longo rosa. “Dever cumprido. Agora vou cuidar de mim”, diz ela, que este ano vai tentar cursar Pedagogia. “Espero conseguir uma vaga pelo Enem”, torce.
Ícaro divide com ela e com Ísis uma casa na Liberdade. O pai, que mora em Feira de Santana, também veio para a formatura. Uma outra irmã mora em Conceição de Feira.

Primeiro aluno de Medicina a entrar por cotas na UFBA recebe diploma

Desafios

O sonho de Medicina surgiu cedo. Ao ver crescer a barriga de três tias que engravidaram na mesma época, a cabeça do menino de 6 anos se encheu de perguntas. “Queria saber como tinha entrado, como saía”, lembra. Com o tempo, esqueceu a obstetrícia: agora quer ser oncologista. “Conviver com esses pacientes, tão carentes de atenção, me despertou para a área. O câncer é uma doença que isola”, reflete.
Se os pacientes sofrem, Ícaro também passou perrengues. Nos dois primeiros anos, além de cursar a faculdade, trabalhava e fazia curso técnico em Química, no Instituto Federal da Bahia (Ifba, então Cefet), que lhe possibilitou ser perito técnico da Polícia Civil.
O rapaz só chegava em casa às 23h e ainda tinha que estudar até as 2h. Várias vezes acabou dormindo em cima dos livros. “Mas nunca repeti nenhuma matéria”, orgulha-se.
O grande impacto na Ufba foi o grau de dificuldade. “A cota facilita a entrada, mas sair depende de você”, analisa.
Hoje, Dr. Ícaro está encaminhado: passou em um concurso para médico do Programa Saúde da Família (PSF). E quer mais. “Quando vi a equipe do (Hospital) Sírio-Libanês que cuidou de Lula falando com os repórteres, pensei: um dia eu é que vou estar aí”.

Projeto propõe cotas obrigatórias

Mesmo com tantas universidades no país adotando cotas, não há uma lei federal que determine regras ou obrigue as instituições a aderirem ao sistema. As universidades têm autonomia para decidir quantas vagas destinarão às cotas e se o critério será socioeconômico ou étnico. Um Projeto de Lei (71/99) sobre o tema já foi aprovado na Câmara e desde 2008 aguarda para ser votado no Senado. Segundo a proposta, apresentada em 1999 pela então deputada federal Nice Lobão (PFL-MA), as universidades públicas federais reservariam vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, tenham renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo e sejam negros, pardos ou indígenas.

No Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Ricardo Lewandowski relata duas ações contra cotas para negros. A primeira foi ajuizada pelo DEM contra a Universidade Federal de Brasília (UnB), onde uma comissão decide por foto ou entrevista quem pode ser classificado como negro, pardo ou branco. A outra foi proposta em maio por um estudante que não foi aprovado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Há ainda no STF mais três ações sobre o sistema de cotas adotado pelo ProUni. Os processos estão na pauta de votação desse ano.

Postado no Blog MariaFrô em o7/01/2012