Ozymandias : um poema sobre o poder e o tempo



Ozymandias



Ozymandias era o apelido utilizado pelos gregos para referirem-se ao faraó Ramsés II (1279 – 1213 a.C.), considerado o mais poderoso de todos os faraós do Egito. É também o nome do famoso soneto do poeta Percy Bysshe Shelley (1792 – 1822), publicado em 1818, que utiliza a imagem deste faraó para transmitir uma visão da passagem do tempo em comparação com nossa história de guerras e impérios. Shelley aborda, de forma irônica, a megalomania dos grandes conquistadores, ao mesmo tempo que transmite uma melancolia que nos convida a refletir sobre a efemeridade e a função da arte.

Este poema nos lembra que todos os projetos de poder — de todas as épocas, inclusive hoje — trazem consigo uma pretensão de eternidade, expansão e divinização. Porém, para o tempo, tudo isso é nada: está destinado a afundar nas areias do esquecimento. Todos os conflitos e sofrimentos (bem como as alegrias e paixões) serão lembranças contadas por algum viajante que atravessou suas ruínas esquecidas. Os desejos dos poderosos não passam de uma ingenuidade de quem se acredita eterno. Justamente por isso, a grande maioria dos impérios se vincula a Deus ou aos deuses, arrogando para si o desejo divino.

Porém, todas essas pretensões serão sempre como a ameaça de Ozymandias, escrita numa pedra esquecida no deserto: “Meu nome é Ozymandias , e sou Rei dos Reis: Desesperai, ó Grandes, vendo as minhas obras!”. É justamente aqui o ponto de maior ironia do soneto, pois o viajante que descreve as ruínas ressalta tanto o abandono das estátuas que encontrou quanto o olhar arrogante de Ozymandias que afunda na areia. O viajante parece não saber quem seria este “Rei dos Reis”, e o poema termina enfatizando as inacabáveis areias solitárias e o abandono do deserto.

Apenas a arte persiste um pouco mais, tentando nos apresentar o eterno surgimento e decadência dos reis, impérios e ditadores. A arte torna-se, por fim, não apenas o registro das paixões e ambições, mas também transforma-se com o tempo em objeto de reflexão. Esta reflexão, contudo, tenta nos transmitir inutilmente uma lição que aparentemente estamos destinados a nunca aprender.

Abaixo coloquei uma tradução do soneto de Shelley, bem como a versão original em inglês.

Ozimandias (tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos, 1989)


Ao vir de antiga terra, disse-me um viajante:
Duas pernas de pedra, enormes e sem corpo,
Acham-se no deserto. E jaz, pouco distante,
Afundando na areia, um rosto já quebrado,
De lábio desdenhoso, olhar frio e arrogante:
Mostra esse aspecto que o escultor bem conhecia
Quantas paixões lá sobrevivem, nos fragmentos,
À mão que as imitava e ao peito que as nutria
No pedestal estas palavras notareis:
“Meu nome é Ozymandias, e sou Rei dos Reis:
Desesperai, ó Grandes, vendo as minhas obras!”
Nada subsiste ali. Em torno à derrocada
Da ruína colossal, a areia ilimitada
Se estende ao longe, rasa, nua, abandonada.

 Ozimandias (Original de Shelley, 1818)


I met a traveller from an antique land
Who said: ― Two vast and trunkless legs of stone
Stand in the desert. Near them on the sand,
Half sunk, a shatter’d visage lies, whose frown
And wrinkled lip and sneer of cold command
Tell that its sculptor well those passions read
Which yet survive, stamp’d on these lifeless things,
The hand that mock’d them and the heart that fed.
And on the pedestal these words appear:
“My name is Ozymandias, king of kings:
Look on my works, ye mighty, and despair!”
Nothing beside remains: round the decay
Of that colossal wreck, boundless and bare,
The lone and level sands stretch far away.








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