Encerrou neste domingo (26) o primeiro Fórum Mundial da Bicicleta. Organizado de forma independente por movimentos ativistas de ciclismo e outros apoiadores da causa, o evento superou expectativas.
Para um dos facilitadores do Fórum, o ciclista Marcelo Sgarbosa, Porto Alegre caminha para a opção coletiva de andar de bicicleta. “Quem anda de bicicleta percebe a cidade de outra forma”, fala.
Ao comentar o passamento da antiga dona da mega boutique de luxo Daslu, Eliana Tranchesi, na madrugada da última sexta-feira (24.02), o apresentador do “Jornal da Noite” (TV Bandeirantes), Bóris Casoy, lançou uma teoria no mínimo inédita: ela teria falecido por culpa do governo Lula, que, em 2005, teria engendrado a Operação Narciso, da Polícia Federal, apenas para desviar o foco do escândalo do mensalão.
Veja, abaixo, o vídeo enviado pelo leitor Evandro. Em seguida, continuo comentando.
Agentes da Polícia Federal (PF), do Ministério Público Federal e da Receita Federal fizeram uma busca na sede da Daslu, naquele ano, para coleta de provas de que a empresa estava envolvida em crimes de sonegação fiscal e contrabando, os quais acabaram sendo comprovados, gerando a Tranchesi pena de prisão de 94 anos, pena que ela jamais sequer começou a cumprir devido à Justiça ter ficado tocada pelo seu estado de saúde.
A tese de Casoy é bastante curiosa. Apesar de a Operação Narciso ter sido levada a cabo, simultaneamente, em São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Espírito Santo, de a Justiça ter autorizado a operação, de o ministério Público ter descoberto o esquema e de a Polícia Federal ter feito mais de mil operações durante o governo Lula, a pobre Tranchesi – que, após seu falecimento, vem sendo tratada pela mídia como uma espécie de Che Guevara capitalista – teria sido vítima de uma armação do governo Lula.
Não se sabe se Casoy considera que Tranchesi faleceu pelo processo criminal todo que enfrentou e não apenas pela operação de 17 de julho de 2005, mas está claro que acha que não deveria nem ter sido processada criminalmente pelos crimes que cometeu simplesmente por estar doente.
O âncora do telejornal da TV Bandeirantes, assim como quase todos os outros colunistas, articulistas e editorialistas da grande imprensa, sempre disse “exagerada” a operação que envolveu 250 policiais federais, apesar de a sede da Daslu, então, ser um prédio de quatro andares e 17 mil metros quadrados, que, pelo tamanho, permitiria que provas fossem tiradas de lá se não tivesse sido cercado e ocupado de surpresa.
Aliás, vale um registro: o uso de 250 policiais na Operação Narciso e a prisão, por alguns dias, da dona da mega boutique de luxo foram considerados “truculência” pelos mesmos colunistas, articulistas e editorialistas – entre os quais o próprio Casoy – que consideraram absolutamente normal o uso de 2 mil policiais militares para desocupar o bairro do Pinheirinho, em São José dos Campos, e que, ali, não enxergaram truculência.
O tratamento VIP dado pela mídia tucana à dona da Daslu pode ser compreendido através da foto abaixo.
A Operação Narciso, naquele 2005, gerou indignação na imprensa e não foi devido à fartura de provas que condenou Eliana Tranchesi a quase cem anos de prisão, com localização de notas de entrada de mercadorias importadas nas quais vestidos de 10 mil reais haviam sido registrados pelo valor singelo de 100 reais.
A explicação para a indignação midiática, pois, reside no fato de que a filha do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin – que, à época, também era governador –, trabalhava na Daslu quando suas operações criminosas foram descobertas. Ela iniciara no trabalho havia pouco tempo como uma das vendedoras da empresa que ficaram conhecidas como “dasluzetes” e pouco depois foi promovida a “diretora de novos negócios”.
Estranhamente, a Secretaria da Fazenda de São Paulo não notou nada de estranho nas operações da Daslu, apesar de que suas operações eram tão escandalosas, com suas notas de entrada com preços populares, que a Polícia Federal chegara à empresa, em 2005, sabendo exatamente o que procurar, o que a obrigou a montar uma operação ampla para evitar que sumissem com as provas.
Segundo o âncora da Band, “Eliana Tranchesi foi exposta à execração pública e humilhada”. Veja só, leitor, que esse sujeito parece entender que tudo aconteceu só por ela ter sonegado algumas centenas de milhões de reais em um esquema que o Ministério Público chamou de “organização criminosa” e que gerou multa de um bilhão de reais, além da ação penal. Chega a parecer que, pelos crimes cometidos, deveriam ter feito uma estátua para Tranchesi.
O comentário de Casoy não contém indignação com a ilegalidade, à diferença da indignação contra as famílias do Pinheirinho. No caso da ricaça, o jornalista mostrou compaixão e indignação por ela ter falecido por desgostos que a descoberta de suas operações ilegais lhe causou, o que, no limite, talvez possa ser verdade, mas não muda o fato de que a culpa foi de quem montou o esquema criminoso, e de mais ninguém.
Postado no Blog da Cidadania Eduardo Guimarães em 25/02/2012
Referimo-nos anteriormente ao fato de o ser humano, nos últimos tempos, ter inaugurado uma nova era geológica – o antropoceno – era em que ele comparece como a grande ameaça à biosfera e o eventual exterminador de sua própria civilização. Há muito que biólogos e cosmólogos estão advertindo a humanidade de que o nível de nossa agressiva intervenção nos processos naturais está acelerando enormemente a sexta extinção em massa de espécies de seres vivos. Ela já está em curso há alguns milhares de anos. Estas extinções, misteriosamente, pertencem ao processo cosmogênico da Terra. Nos últimos 540 milhões de anos ela conheceu cinco grandes extinções em massa, praticamente uma em cada cem milhões de anos, exterminando grande parte da vida no mar e na terra. A última ocorreu há 65 milhões de anos quando foram dizimados os dinossauros entre outros.
Até agora todas as extinções eram ocasionadas pelas forças do próprio universo e da Terra a exemplo da queda de meteoros rasantes ou de convulsões climáticas. A sexta está sendo acelerada pelo próprio ser humano. Sem a presença dele, uma espécie desaparecia a cada cinco anos. Agora, por causa de nossa agressividade industrialista e consumista, multiplicamos a extinção em cem mil vezes, diz-nos o cosmólogo Brian Swimme em entrevista recente no Enlighten Next Magazin, n.19. Os dados são estarrecedores: Paul Ehrlich, professor de ecologia em Standford calcula em 250.000 espécies exterminadas por ano, enquanto Edward O. Wilson de Harvard dá números mais baixos, entre 27.000 e 100.000 espécies por ano (R. Barbault, Ecologia geral 2011, p.318).
O ecólogo E. Goldsmith da Universidade da Georgia afirma que a humanidade ao tornar o mundo cada vez mais empobrecido, degradado e menos capaz de sustentar a vida, tem revertido em três milhões de anos o processo da evolução. O pior é que não nos damos conta desta prática devastadora nem estamos preparados para avaliar o que significa uma extinção em massa. Ela significa simplesmente a destruição das bases ecológicas da vida na Terra e a eventual interrupção de nosso ensaio civilizatório e quiçá até de nossa própria espécie. Thomas Berry, o pai da ecologia americana, escreveu:”Nossas tradições éticas sabem lidar com o suicídio, o homicídio e mesmo com o genocídio mas não sabem lidar com o biocídio e o geocídio”(Our Way into the Future, 1990 p.104).
Podemos desacelerar a sexta extinção em massa já que somos seus principais causadores? Podemos e devemos. Um bom sinal é que estamos despertando a consciência de nossas origens há 13,7 bilhões de anos e de nossa responsabilidade pelo futuro da vida. É o universo que suscita tudo isso em nós porque está a nosso favor e não contra nós. Mas ele pede a nossa cooperação já que somos os maiores causadores de tantos danos. Agora é a hora de despertar enquanto há tempo.
O primeiro que importa fazer é renovar o pacto natural entre Terra e Humanidade. A Terra nos dá tudo o que precisamos. No pacto, a nossa retribuição deve ser o cuidado e o respeito pelos limites da Terra. Mas, ingratos, lhe devolvemos com chutes, facadas, bombas e práticas ecocidas e biocidas.
O segundo é reforçar a reciprocidade ou a mutualidade: buscar aquela relação pela qual entramos em sintonia com os dinamismos dos ecossistemas, usando-os racionalmente, devolvendo-lhes a vitalidade e garantindo-lhes sustentabilidade. Para isso necessitamos nos reinventar como espécie que se preocupa com as demais espécies e aprende a conviver com toda a comunidade de vida. Devemos ser mais cooperativos que competitivos, ter mais cuidado que vontade de submeter e reconhecer e respeitar o valor intrínseco de cada ser.
O terceiro é viver a compaixão não só entre os humanos mas para com todos os seres, compaixão como forma de amor e cuidado. A partir de agora eles dependem de nós se vão continuar a viver ou se serão condenados a desaparecer. Precisamos deixar para trás o paradigma de dominação que reforça a extinção em massa e viver aquele do cuidado e do respeito que preserva e prolonga a vida.
No meio do antropoceno, urge inaugurar a era ecozóica que coloca o ecológico no centro de nosas atenções. Só assim há esperança de salvar nossa civilização e de permitir a continuidade de nosso planeta vivo.
Leonardo Boff é autor com Mark Hathaway de O Tao da Libertação: explorando a ecologia da transformação, Vozes 2011.
Era fim de tarde de uma terça-feira de Carnaval. Eu e meu pequeno Gabriel resolvemos ir ao supermercado comprar sorvete. Na volta ouvíamos Lucy in the sky with diamonds, na voz de Rita Lee. De repente, deparamo-nos com um enorme arco-íris. Há muito não via um tão colorido e perfeito no céu. Estacionamos para apreciá-lo. Uma chuva fraca ainda caía. Choveu praticamente o dia todo. Perguntei a ele se sabia quantas cores tinha um arco-íris. Gabriel fez que não e resolvemos contar: sete. Aí decidimos memorizar para quando chegássemos em casa fazermos um lindo desenho.
Falei para ele que no pé do arco-íris havia um tesouro e ele disse que sempre teve vontade de encontrar um. Sugeri que seguíssemos em direção ao cristo redentor (o mirante da cidade) para ver se o alcançávamos. Quanto mais andávamos, mais longe ele ficava. Expliquei que o arco-íris nunca deixava ninguém chegar perto dele. Gabriel perguntou se eu achava que o arco-íris tinha olhos. Respondi que sim. Quando chegamos lá no topo ele havia perdido o brilho intenso das cores, de quando o avistamos pela primeira vez.
Na descida para casa voltamos ouvindo e cantando Mama África e, à distância, novamente pudemos alcançar o ângulo de prisma para vê-lo novamente uma última vez. Foi quando o som do carro começou a tocar, coincidentemente, Somewhere over the rainbow. Para quem não se lembra, aí vai uma versão do gênio Keith Jarrett:
Seguimos para casa com planos de tomar sorvete primeiro e fazer nosso desenho depois (este aí de cima). Na mesa, enquanto saboreava seu sorvete de flocos Gabriel ouviu: - Filho, sabe porque não preciso correr atrás do tesouro do arco-íris? - Por quê, pai? - Porque meu tesouro é você! Seguiu-se uma sonora gargalhada de ambos e a sensação de que naquela meia hora eu e ele tínhamos vivido uma rica experiência que nos serviria para toda a vida.
Criar filhos não é fácil. Quem vê assim acha que é só alegria. Não é. Tem hora que perdemos a paciência, ficamos de "saco cheio" de ter que suportá-los, cuidar deles, alimentá-los, levá-los para passear... Ih, são tantas renúncias... Mas tem hora que uma mágica se faz e, em sintonia com o universo, uma pequena experiência vira uma grande viagem, em algum lugar bem além do arco-íris!
Exibir um sorriso, mas espumar de nervosismo por dentro, está longe de ser uma atitude saudável. Suas emoções precisam ter vazão ou há o risco de que elas comecem a se refletir em problemas físicos, desde dores nas costas até taquicardia ou falta de ar, por exemplo.
Não banque o palhaço com você mesmo: o bom humor precisa ser sincero. "Ele é um jeito de encarar a vida, uma postura positiva e aberta para enfrentar o que vier com mais disposição", afirma a psicóloga Marina Vasconcellos, especialista em psicodrama.
Aprenda a levar a vida de forma mais leve, usando o humor a seu favor, sem que o sorriso fique apenas na aparência.
Organize a sua rotina
Com organização, é possível se programar melhor para dar conta de todas as tarefas. "O planejamento ajuda a evitar aflições ou crises de desespero por não conseguir cumprir os prazos ou por esquecer alguma atividade em meio à falta de prioridades", afirma a psicóloga Marina Vasconcellos. "Tudo isso traz uma rotina mais tranquila e, como consequencia, o bom humor."
Não fuja de situações frustrantes
Fingir que não existe sofrimento pode até deixar seu bom humor intacto por um tempo. Mas os momentos frustrantes não deixam de existir simplesmente porque você fugiu deles. Use essas situações para amadurecer e encarar os desafios com mais facilidade. "As frustrações são oportunidades para o crescimento pessoal, mas cabe a cada um tomar o cuidado de não desperdiçar essas chances", afirma a psicóloga Márcia Cavalieri, de Ribeirão Preto.
Permita-se errar
Não é pra viver pessimista, mas para considerar que há sempre ao menos duas possibilidades, e uma delas pode ser diferente da sua expectativa. Com esse preparo emocional, as chances de você ficar de mau humor com o pior resultado diminuem. "É preciso sonhar e desejar, mas sem deixar de lado as reais possibilidades. Assim a frustração deixa de ser um peso tão grande", afirma Márcia.
Comemore cada pequena conquista
Quem imagina a felicidade como uma sequencia permanente de grandes emoções pode viver frustrado buscando isso a vida inteira. "Os momentos simples precisam ser mais valorizados, assim, naturalmente, você passa a cultivar mais o sorriso, o bom humor. Fica mais fácil reconhecer o que trás felicidade em vez viver em busca dela", afirma a psicóloga Marina.
Aprenda com os erros
Depois que o erro já foi cometido, o mau humor não ajuda em nada. A psicóloga Marina Vasconcellos propõe que você deixe de considerar o erro como o fim de tudo, algo que desanima e leva à desistência frente a um objetivo. "Em vez de se irritar, pense como reagir em uma próxima ocasião, quando algo sair do programado ou esperado", afirma a profissional.
Esvazie a cabeça
O excesso de pensamento negativo não dá espaço para o bom humor. Procure se esforçar para pensar no problema por um determinado período, concentrando as suas energias para resolvê-lo. Mas depois mude o foco e pense em outras coisas, sua saúde mental vai agradecer. "Não há contribuição maior para o bom humor do que a capacidade de resolver os próprios problemas em vez de permanecer se lamentando deles", diz Márcia.
Dê risada!
Quando damos gargalhadas, os níveis de cortisol e adrenalina - hormônios do estresse - baixam. Além disso, o cérebro passa a produzir endorfina, hormônio que deixa o corpo mais relaxado. Mas a risada precisa ser sincera, por isso, procure situações prazerosas que permitam você passar mais tempo descontraído.
O caminho para o bom humor e uma vida mais leve são fáceis, só depende de você e da sua dedicação. Aproveite este novo ano que está chegando e coloque nossas dicas em prática, você vai ver que vale a pena.
Paulo Henrique Amorim, assim como eu e muitos blogueiros e jornalistas brasileiros, nos empenhamos há muito tempo numa guerra sem trégua a combater o racismo, a homofobia e a injustiça social no Brasil. Fazemos isso com as poderosas armas que nos couberam, a internet, a blogosfera, as redes sociais.
Foi por meio de pessoas como PHA, lá no início desse processo de abertura da internet, que o brasileiro descobriu que poderia, finalmente, quebrar o monopólio da informação mantido, por décadas a fio, pelos poderosos grupos de comunicação que ainda tanto fazem políticos e autoridades do governo se urinar nas calças. PHA consolidou o termo PIG (Partido da Imprensa Golpista) e muitos outros com humor, inteligência e sarcasmo, características cada vez mais raras entre os jornalistas brasileiros. Tem sido ele que, diuturnamente, denuncia essa farsa que é a democracia racial no Brasil, farsa burlesca exposta em obras como o livro “Não somos racistas”, do jornalista Ali Kamel, da TV Globo.
Por isso, classificar Paulo Henrique Amorim de racista vai além de qualquer piada de mau gosto. É, por assim dizer, a inversão absoluta de valores e opiniões que tem como base a interpretação rasa de um acordo judicial, e não uma condenação. Como se fosse possível condenar PHA por racismo a partir de outra acusação, esta, feita por ele, e coberta de fel: a de que Heraldo Pereira, repórter da TV Globo, é um “negro de alma branca”.
O termo é pejorativo, disso não há dúvida. Mas nada tem a ver com racismo. A expressão “negro de alma branca”, por mais cruel que possa ser, é a expressão, justamente, do anti-racismo, é a expressão angustiada de muitos que militam nos movimentos negros contra aqueles pares que, ao longo dos séculos, têm abaixado a cabeça aos desmandos das elites brancas que os espancaram, violentaram e humilharam. O “negro de alma branca” é o negro que renega sua cor, sua raça, em nome dessa falsa democracia racial tão cara a quem dela usufrui. É o negro que se finge de branco para branco ser, mas que nunca será, não neste Brasil de agora, não nesta nação ainda dominada por essa elite abominável, iletrada e predatória – e branca. O “negro de alma branca” é o negro que foge de si mesmo na esperança de ser aceito onde jamais será. Quem finge não saber disso, finge também que não há racismo no Brasil.
Recentemente, fui chamado de racista por um idiota do PCdoB, partido do qual sou, eventualmente, eleitor, e onde tenho muitos amigos. Meu crime foi lembrar ao mundo que o vereador Netinho de Paula, pagodeiro recentemente convertido ao marxismo, havia espancado a esposa, em tempos recentes. E que havia dado um soco na cara do repórter Vesgo, do Pânico na TV. Assim como PHA agora, fui vítima de uma tentativa primária de psicologia reversa cujo objetivo era o de anular a questão essencial da discussão: a de que Netinho de Paula era um espancador, não um negro, informação esta que sequer citei no meu texto, por absolutamente irrelevante. Da mesma forma, Paulo Henrique Amorim se referiu a Heraldo Pereira como negro não para desmerecer-lhe a cor e a raça, mas para opinar sobre aquilo que lhe pareceu um defeito: o de que o repórter da TV Globo tinha “a alma branca”, ou seja, vivia alheio às necessidades e lutas dos demais negros do país, como se da elite branca fosse.
Não concordo com a expressão usada por PHA. Mas não posso deixar de me posicionar nesse momento em que um jornalista militante contra o racismo é acusado, levianamente, de ser racista, apenas porque se viu na obrigação de fazer um acordo judicial ruim. Não houve crime, sequer insinuação, de racismo nessa pendenga. Porque se pode falar muita coisa sobre Paulo Henrique Amorim, menos, definitivamente, que ele é racista. Qualquer outra interpretação é falsa ou movida por ma fé e vingança pessoal de quem passou a ser obrigado, desde o surgimento do blog “Conversa Afiada”, a conviver com a crítica e os textos adoravelmente sacanas desse grande jornalista brasileiro.
Na semana passada, a imprensa veiculou a notícia de que uma construtora servia-se de trabalho escravo.
A obra não era uma hidrelétrica na região Norte ou em algum lugar de difícil acesso, onde sempre é mais complicado descobrir o que se passa. Na verdade, a obra encontrava-se quase na esquina com a avenida Paulista.
Trata-se da reforma de um dos mais conhecidos hospitais da capital paulista, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Ironicamente, a empresa responsável pela obra chama-se "Racional" Engenharia.
Como não podia deixar de ser, a empresa afirmou que os trabalhadores respondiam a uma empresa terceirizada e que os dirigentes desconheciam realidade tão irracional. Este foi o mesmo argumento que a rede espanhola de roupas Zara utilizou quando foi flagrada servindo-se de mão de obra escrava boliviana empregada em oficinas terceirizadas no Bom Retiro.
É muito interessante como empresas que gastam fortunas em publicidade e propaganda institucional são tão pouco cuidadosas no que diz respeito às condições aviltantes de trabalho das quais se beneficiam por meio do truque tosco da terceirização. Quando se contrata uma empresa terceirizada, não é, de fato, complicado averiguar as reais condições a que trabalhadores estão submetidos, se seus turnos são respeitados e se seus alojamentos são decentes.
Há de se perguntar se tal desenvoltura não é resultado da crença de que ninguém nunca perceberá o curto-circuito entre imagens institucionais modernas, requintadas, "racionais", e sistemas medievais de exploração.
No fundo, essa parece ser mais uma faceta de um velho automatismo brasileiro de repetição: discursos cada vez mais elaborados e modernos, práticas cada vez mais arcaicas. Afinal, tal precariedade foi feita em nome de novas práticas trabalhistas, mais flexíveis e adaptadas aos tempos redentores que, enfim, chegaram.
Não mais a rigidez do emprego e do controle dos sindicatos, mas a leveza do paraíso da terceirização, onde todos serão, em um horizonte próximo, empresas. Cada trabalhador, um empresário de si mesmo.
Que essa flexibilidade tenha aberto as portas para uma vulnerabilidade que remete trabalhadores à pura e simples escravidão, isto não retiraria em nada o brilho da ideia. Pois apenas os que temem o risco e a inovação poderiam querer ainda as velhas práticas trabalhistas. Pena que o novo tenha uma cara tão velha.
Pena também que, como os gregos mostrem a cada dia, quem paga o verdadeiro preço do risco sejam, como dizia o velho Marx, os que já perderam tudo.
Artigo do professor Vladimir Safatle, da Filosofia da USP. Publicado na Folha, no último dia 14/2.