As lições do BBB 12




Quem disse que a edição brasileira da franquia holandesa Big Brother não serve para nada? Certamente é inútil do ponto de vista cultural, sociológico, antropológico ou do mais tênue bom gosto. Não serve nem como lazer porque induz a exacerbação de sentimentos negativos, incompatíveis com a descontração e a alegria que caracterizam – ou deveriam caracterizar – o entretenimento. Mas serve como exemplo do que não presta na televisão brasileira.
Sim, o Big Brother Brasil tem lições a ensinar que vão desde como não expor comportamento e linguajar inadequados na tevê até o limiar da criminalidade, seja em termos sexuais, “raciais” ou de agressão à formação de crianças e adolescentes ou do próprio direito de pais e responsáveis de lhes imporem o ritmo que bem entenderem até poderem vivenciar ou conhecer o que poderíamos chamar de “fatos da vida”, por assim dizer.
Em primeiro plano ficou a hipótese repugnante de uma garota de idade análoga à de minhas filhas ter sido obrigada a ir “até o fim” em um namorico regado a uma substância que lhe entorpeceu a razão e que vem sendo alvo de iniciativas legais de lhe proibir a publicidade nos meios de comunicação de massa assim como ocorreu com o tabaco, pois os efeitos nefastos do álcool – e do estímulo ao consumo – dispensam apresentações.
Em plano igualmente grave, ainda que menos focado, está hipótese de racismo contra alguém que na estréia do Big Brother respondeu negativamente à pergunta do apresentador Pedro Bial sobre se via “necessidade de cotas para negros no BBB”, pergunta que lhe foi feita por ser o único negro do programa. Se o rapaz “estuprou”, não se sabe, mas sabe-se que, a partir de agora, o programa não terá negro nenhum e os de sempre dirão o que já ouvi, ou seja, que de “gente assim” não se poderia “esperar outra coisa”.
O plano mais importante, porém, é o que está em terceiro lugar. E a cena que o ilustra é bem eloquente: duas meninas de 10 anos e um garoto de 9 debatem, acaloradamente, tudo o que os adultos estão debatendo sobre o caso, porém ainda sem saber direito o que seria o tal “estrupo” de que tanto falam, ainda que especulem sobre o que cabeças, corpos e membros do casal de “brothers” faziam sob o edredon.
Em benefício dos mais sensíveis, o leitor será poupado dos detalhes do diálogo.
Há, ainda, uma quarta lição que a atração da Rede Globo e a própria deixam ao país: os interesses empresariais e econômicos dos detentores de concessões públicas de rádio e televisão, sejam eles quem forem, não se sobrepõem à formação moral de crianças e adolescentes e aos direitos civis dos próprios integrantes voluntários desse programa ou similares, direitos que não podem ser violados nem sob anuência de seus detentores.
O saldo desse episódio envolve uma imensa lição, quase uma grade curricular, portanto.
O casal de “brothers” foi exposto da pior forma possível. A moça está tendo sua honra posta em dúvida de forma indelével e permanente, o rapaz corre o risco de ter sua vida destruída, pois ninguém quer empregar ou ter ligações com um estuprador independentemente do que realmente tenha acontecido sob o edredon, e crianças estão tendo que encarar precocemente o lado mais cru dos fatos da vida, queiram seus pais e responsáveis ou não.
Já o Estado brasileiro corre o risco de deixar claro que não serve para nada ao permitir que empresários inescrupulosos joguem com as vidas de tantos atores – dezenas de milhões deles, não nos esqueçamos – sem que qualquer autoridade diga um A, pois a única autoridade que se manifestou agiu em defesa do lado que está longe de ser o mais vulnerável, não obstante o seu direito inquestionável de proteção contra eventual abuso que possa ter sofrido.
Viu quanta coisa aprendemos com o “BBB”, leitor?
Postado por Eduardo Guimarães no Blog Cidadania em 17/01/2012

Silicone-bomba, um problema para levar no peito


Nada menos do que 12,5 mil mulheres no Brasil colocaram próteses de silicone da fabricante francesa PIP e outras 7 mil da holandesa Rofil.
O material utilizado pelas empresas é de baixa qualidade, semelhante ao do tipo industrial. As substâncias presentes são potencialmente tóxicas, a prótese tende a romper mais cedo do que as de alta qualidade. Com isso, infiltram-se em músculos, gânglios linfáticos, nervos e glândulas mamárias. Extravasando, leva a inflamações, infecções e nódulos.
Os países que utilizavam próteses dessas marcas anunciaram recall, a notícia repercutiu e, depois de uma leve esperneada das autoridades de Saúde, o Brasil entrou na roda. A própria presidente Dilma determinou na última quarta-feira, 11 de janeiro, que tanto o SUS quanto os planos de saúde devem pagar a troca das próteses rompidas, não importando se o implante foi por indicação clínica, nos casos de reparação à cirurgia mutiladora das mamas, ou por estética para aumentar os seios.
A troca não será feita a pedido para aquelas que portam os silicones das marcas PIP e Rofil se o implante estiver em bom estado ou apenas fragilizado, mas será garantido um acompanhamento às mulheres que portam os modelos de silicone-bomba. Haja coração, coragem e estabilidade emocional para suportar a tensão de portar um silicone desses.
Utilizados como indicação clínica para melhorar a estética após a mastectomia, os implantes de silicone abriram mercado farto na indústria da cirurgia plástica exclusivamente estética com apoio do business da moda popular no mundo inteiro. A partir de uma campanha muito bem elaborada, os seios pequenos foram extintos do mercado da moda junto com as roupas adequadas às mulheres que não se submeteram ao novo paradigma de corpo feminino. O padrão ideal de beleza que emergiu nos anos 1990, com o boom das próteses, é uma mulher magra, alta, peituda e bunduda. As roupas já vêm prontas nas lojas para os seios avantajados. Para atenuar o “problema” das que não aderiram às plásticas, abundam as lingeries com falsos peitos e falsas bundas de espuma. Mas esse é definitivamente um problema menor. A aparência é apenas visual e não cirúrgica. A mulher sem roupa continua sendo ela mesma.
A reflexão pertinente, diante do caso de saúde pública mundial envolvendo as próteses de silicone, é a banalização das cirurgias plásticas essencialmente estéticas e seus critérios, ou melhor, a falta deles.
Ficaram tão frouxos esses critérios, que agora temos aí uma vastidão de mulheres portando próteses de silicone suscetíveis de rompimento. São mulheres de todas as idades, inclusive adolescentes.
Mocinhas de 15 anos podem colocar silicone no Brasil, assim como qualquer senhora de 50 ou 60 anos, o que vem ocorrendo em larga escala.
A cirurgia para implantação de silicone contou desde seus primórdios com o apoio promocional da mídia. Programas como Dr Hollywood, um reality show que mescla a vida pessoal e profissional do cirurgião, fazem enorme sucesso. http://www.youtube.com/watch?v=HmnZKQdHVSY
Outros cirurgiões plásticos, como o Dr. Marcelo Assis, fazem questão de fazer o marketing pró-silicone em programas de entrevista, com um tom mais sério. Ele chega a afirmar que a prótese facilitaria a prevenção do câncer de mama.
Em 20 anos de moda médica para implantes de silicone, foram cinco gerações em próteses, sempre com apoio maciço do mercado médico via mídia. Novas técnicas cirúrgicas também surgiram para responder aos problemas enfrentados pelas mulheres com as primeiras próteses, que atrapalhavam a amamentação. Criou-se uma nova cultura, baseada em fins comerciais, que unificou a autoestima com o tamanho dos seios. Nem as lolitas ficaram de fora.
A adolescência, período de nossas vidas que sempre foi marcado por questionamentos, justamente porque é uma fase em que o corpo começa a ganhar formas diferentes, não costuma ser fácil para 9 entre 10 meninas e meninos. Sempre coube aos pais, família e escola, desenvolver em bases sólidas a autoestima do adolescente, ajudando-o a entender que a pessoa existe pelo que é, não pelo que aparenta ser, que somos únicos entre bilhões e que há em nós muitas particularidades. Cinema, literatura, gosto pelos estudos, música, esportes, artes em geral sempre ajudaram os adolescentes a ultrapassar as inseguranças dos primeiros anos dessa fase.
Um longo processo de amadurecimento e descoberta da sexualidade, que envolve hormônios, músculos e processos de raciocínio reflexivo, não sem a dor e o prazer das singularidades, acabou sendo direcionado para uma urgência de ser o que o mercado exige que sejamos já em tenra idade. Aos 15 anos, aos primeiros sinais desse processo, já estão as adolescentes sendo incentivadas e autorizados a prestar contas de aparências consideradas ideais por meio de cirurgias estéticas.
Um levantamento da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica em que foram ouvidos 3 533 médicos associados revelou que, dos 629 mil procedimentos cirúrgicos estéticos feitos entre setembro de 2007 e agosto de 2008, 37,7 mil foram efetuados em adolescentes. O próprio presidente da SBCP, Sebastião Guerra, revela que colocou próteses em 8 garotas de 15 anos em três anos de atendimento. Apontar na direção da insegurança natural dos adolescentes éacertar em alvo fácil.
A adolescência não é a única fase de nossas vidas em que surgem sentimentos de insegurança em relação à aparência. A cada nova etapa de transformação hormonal ou de experiências desestabilizadoras, fracassos e fragilidades, o cérebro reage e vivemos sentimentos de inadequação. A medicina da cirurgia plástica está aí para usar o bisturi sem considerar o que se pode fazer de mais efetivamente eficiente de dentro para fora.
Hoje é raro encontrar uma jovem mãe de 30 anos que não sonhe em colocar uma prótese de silicone para tentar reaver, ainda que com cicatriz e talvez falta de sensibilidade, os seios juvenis.
É claro que há uma modificação estética, sempre houve e todas as mulheres desde que o mundo é mundo percebiam essas mudanças. Mesmo as que não são mães e não amamentam experimentam no próprio corpo a flacidez do tecido mamário.
A urgência, esse desespero em massa para adquirir um seio de silicone, precisa ser revista com mais calma por mulheres e por homens, por toda a sociedade. Principalmente podemos examinar com mais acuidade os argumentos chulos que nos levam a deixar uma filha adolescente colocar uma prótese num corpo sadio em desenvolvimento.
Afirma-se levianamente no universo das plásticas cirúrgicas que uma boa aparência resolve problemas de autoestima. Boa aparência, ótima aparência, aparência ideal, formal, clean, bicho-grilo, aparência de grife e todas as formas de aparência têm a ver com vaidade, não com autoestima, que é outra coisa bem diferente.
Sim, envaidecer-se, enfeitar-se, em todo e qualquer grau e para todos os gostos, nos leva a um sentimento de bem-estar, superficial e passageiro como um final de festa.
Não se sabe de que pele literária tiraram esses doutores que mexer nas profundezas da aparência, com cortes e costuras, resolve problemas de autoestima.
Autoestima sempre foi e sempre será uma sensação interna de se saber singular, uma questão de conteúdo, utilidade, conexão com as singularidades dos outros e do mundo. Autoestima tem a ver com sentimentos e pensamentos que se tornam ação. Essa ligação direta entre seio de silicone e autoestima das mulheres é uma balela que precisamos enfrentar com um pouquinho mais de profundidade.
Confundir investimento em vaidade com investimento em autoestima é o mesmo que afirmar ser possível matar a fome de alguém com a foto de um prato de comida.
É espantoso também o número de senhoras de 50 anos que coloca silicone. Frases como “esses seios flácidos não me pertencem” vagam por aí.
O que será mais que deixamos de realizar na vida para chegar aos 50 anos em busca de um peitão empinado?
O que buscamos de fato nessa luta incessante contra os sinais da maturidade não seria a essência de uma autoestima que jamais foi trabalhada, mas confundida com investimentos em vaidade?
O que amamos nos outros e em nós mesmos ficou assim tão menor que só a mudança de aparência resolve?
É emblemático que o medo do câncer, recheado de exames preventivos, não surja quando as mulheres resolvem se submeter apenas por uma questão estética a essa cirurgia, que de delicada não tem nada.
Cláudia Rodrigues, jornalista, terapeuta reichiana, autora de Bebês de Mamães mais que Perfeitas, 2008. Centauro Editora. Blog: Buenaleche.

Postado no Blog Sul21 em 14/01/2012

Andre Rieu ! Virá ao Brasil em Maio













Sorrir faz bem !













Bolo Rápido de Abacaxi



            



Ingredientes

1 caixa ou pacote de mistura para bolo de abacaxi
3 ovos
1 caixa de gelatina de abacaxi
1 pote de yogurte natural

Preparo

Bater todos os ingredientes no liquidificador.
Colocar em forma untada e assar por mais ou menos 30 min.

Cobertura 

1 lata de leite condensado
1 caixa de creme de leite
1 envelope de pó para refresco de abacaxi tipo tang ou marca preferida

Preparo da Cobertura

Bater todos os ingredientes da cobertura no liquidificador.
Espalhar sobre o bolo pronto e frio.


A mesma receita pode ser feita substituindo todos os ingredientes com sabor de abacaxi por outros sabores, por exemplo, sabor de morango, sabor de limão, sabor de frutas vermelhas, etc. 


Religiosidade e intolerância





Esperei que passasse a indignação para registrar episódios que corroboraram minha percepção de que a intensidade da religiosidade de um indivíduo pode ser proporcional ao seu grau de intolerância não só ao que contraria dogmas religiosos, mas até aos valores primordiais que tais dogmas impõem, tais como solidariedade, tolerância e compaixão.
A religião deveria tornar o indivíduo melhor, mais humano, mais solidário, mais generoso, mais piedoso, mas, na prática, nem sempre é o que acontece. Quanto maior o nível de religiosidade, maior parece ser a incapacidade de amar ao próximo como a si mesmo.
O que feriu profundamente a mim e à minha família foram novas demonstrações de intolerância de moradores do edifício em que resido, que fica em um bairro no qual, ao menos em tese, as pessoas deveriam ser mais esclarecidas e civilizadas. Esses moradores vêm implicando com a minha filha Victoria, de 13 anos, portadora de severa paralisia cerebral.
Detalhe: são moradores que frequentam intensamente paróquia da igreja católica próxima de minha residência, paróquia na qual exercem atividades voluntárias.
Victoria, por sua condição de saúde, usa serviço de home care. Por conta disso, minha residência parece um hospital. Sete dias por semana, já no alvorecer, começa uma romaria de profissionais de saúde em casa, tais como enfermeira, terapeutas e médicos.
A enfermeira que cuida de minha filha enquanto eu e minha mulher trabalhamos relata broncas que levou de moradores do prédio. Uma dessas broncas se deveu à fisioterapia que a menina faz às nove da manhã e às quatro da tarde, e a outra ao passeio matinal que a enfermeira faz com ela.
Minha filha não anda, por isso tanto a fisioterapeuta da manhã quanto o fisioterapeuta da tarde colocam um equipamento em suas pernas que as mantém retas, pois a tendência causada pela enfermidade neurológica é a de que fiquem sempre dobradas. Com o extensor colocado, os profissionais fazem a menina “andar”.
Por causa da mobília do apartamento, que interfere no percurso da caminhada que minha filha tem que fazer amparada pelos fisioterapeutas, é preciso usar o corredor do andar. Victoria, porém, costuma emitir sons característicos de bebês antes de aprenderem a falar e, como os profissionais “conversam” com ela, a terapia provoca algum barulho na área comum do prédio.
O vizinho do andar do meu apartamento, um juiz aposentado e solitário que perdeu a esposa faz poucos anos, adora esses horários em que a minha filha sai ao corredor. Ele também sai e se delicia com a menina fazendo terapia. Brinca com ela, conversa com os terapeutas.  Diz que Victoria é a sua “alegria”.
Acredite quem quiser, mas a vizinha de outro andar, conhecida no prédio como “beata”, foi ao meu andar, quando a menina saiu ao corredor para fazer terapia, e reclamou do “barulho” que ela, a enfermeira e a fisioterapeuta da manhã faziam não havia mais do que vinte minutos.
Já durante o passeio matinal, a enfermeira tem que driblar a escada do saguão do prédio para ter acesso à rua com a cadeira de rodas. Outro vizinho, também freqüentador assíduo da mesma paróquia que a “beata”, reclamou da demora que a falta de uma rampa gera e que obriga quem está entrando ou saindo do prédio a esperar. Esse vizinho, então, exigiu que a enfermeira saísse com a minha filha pela garagem, o que eu a proibi de fazer novamente.
Essa situação é recorrente. Vira e mexe essas pessoas reclamam do que expus. São pessoas que vivem enfiadas na igreja, exalando cânticos e orações, fazendo profissões de fé, pregando justamente o que lhes falta.
As religiões também são os piores entraves a direitos civis para homossexuais, a direitos da mulher, a métodos contraceptivos, enfim, são verdadeiras usinas de intolerância contra minorias, mas não só. Pessoas exageradamente religiosas frequentemente têm menos paciência, até quando se trata de uma criança que padece tanto quanto a minha filha.
Não, não há, aqui, uma generalização. É claro que ter religião não torna ninguém intolerante com a diferença e insensível com seus semelhantes. O que espanta é que a religiosidade exacerbada, aquela que beira o fanatismo, também leva o indivíduo a ter comportamentos como o que descrevi. Ratos de igreja, salvo exceções, são pessoas mal-humoradas, pouco solidárias e preconceituosas.
Não deveria ser o contrário? Quem se dedica mais a religiões que pregam tolerância, amor ao próximo, piedade e solidariedade não deveria ser alguém que tem mais desses atributos em vez de menos? E se muitos dos que se expõem exageradamente a dogmas religiosos agem assim, as religiões não acabam sendo responsáveis por suas carências espirituais e morais?
Sou de família católica. Estudei em escolas católicas. Casei-me no religioso e batizei meus filhos. Contudo, constatar fatos como esses durante a vida me afastou da igreja. Apesar de ter fé em Deus, ver o que religiões causam à alma me fez rejeitar intermediários com o Criador. Errar sozinho eu sei. Redimir os erros, também.

Postado por Eduardo Guimarães no Blog da Cidadania em 12/01/2012



Covardia político-midiática veta única solução real para o crack




O desastre que a operação policial na Cracolândia de São Paulo encerra transtorna a vida da capital paulista e envergonha a cidade, o Estado e até o país, pois revela a mentalidade atrasada da sociedade brasileira e a covardia da nossa classe política e até da imprensa, que sabem que existe uma solução para o problema das drogas, mas a ignoram e escondem.
No mundo inteiro, a drogadição é uma tragédia. Contudo, alguns países – os mais avançados em termos sócio-econômicos – conseguiram reduzir drasticamente essas chagas sociais com políticas públicas realistas, dentre as quais sobressai a Política de Redução de Danos, representada pelas “narcossalas” ou “salas de uso seguro”.
A XXI Conferência Internacional de Redução de Danos, realizada no ano passado em Liverpool, na Inglaterra, expôs os avanços que as nações mais civilizadas do planeta alcançaram na questão das drogas através do uso das narcossalas, e se debruçou sobre a imperiosidade de expandir essa política pública para regiões menos desenvolvidas como a América Latina, nas quais sociedades conservadoras obrigam a classe política a adotar repressão e violência contra usuários de drogas.
O baixo nível cultural e educacional dos povos latino-americanos, entre outros, não se restringe às classes populares. As elites econômicas vibram com operações policiais truculentas por confundirem políticas de segurança publica reais e efetivas com vingança contra criminosos e até contra as principais vítimas do tráfico, os usuários.
A incompetência desumana da ação policial em São Paulo, na Cracolândia, onde o governo do Estado e a prefeitura da capital decidiram pela técnica de “sufoco, dor e sofrimento” contra pessoas mentalmente doentes e que não têm mais nada a perder na vida, exibe o assustador despreparo das autoridades locais e até da grande imprensa.
A conferência sobre redução de danos que teve lugar na Europa, ano passado, contabilizou o extremo sucesso dessa política pública que consiste na implantação de centros para viciados nos quais recebem drogas –  ou substâncias alternativas que produzem os mesmos efeitos da droga convencional, mas fazem menos mal – para consumo controlado e assistido e podem recorrer a tratamento de desintoxicação, se quiserem.
Vejam só o que ocorre na Cracolândia paulistana. Nem sob ameaça de uma polícia truculenta, mal-paga, inculta, despreparada e corrupta os viciados se intimidam. A “fissura” pela droga já se tornou a razão da existência desses seres humanos, de forma que não há nada mais assustador para o viciado em crack do que não ter como se drogar. Violência policial não intimida essas pessoas.
Por isso, na abertura da 21ª edição da conferência sobre Redução de Danos o sociólogo especializado em saúde pública Gerry Stimson, atual diretor da International Harm Reduction Association (IHRA), que organiza a conferência, considerou que o grande desafio hoje é conscientizar sociedades conservadoras do Terceiro Mundo.
Ano passado, a Conferência relatou que há hoje 93 países e territórios no mundo que adotaram a Redução de Danos. No entanto, em certos países em que o conceito foi adotado os resultados não foram tão bons porque os recursos investidos foram insuficientes. Esse é o grande erro, pois economizam recursos de um lado (na estrutura da Redução de Danos) e gastam em outro (no combate ao tráfico e na assistência médica aos viciados em estado terminal).
Vemos como os usuários de crack em São Paulo não se deixam intimidar ou convencer. Apanham, são escorraçados, humilhados, ameaçados e mesmo assim não cedem e nem cogitam fazê-lo simplesmente porque não podem, pois não há tortura maior para seus corpos e mentes do que ficar sem droga para consumir.
O mais trágico que a covardia da classe política gera pode ser visto nas meninas, algumas pré-adolescentes que parecem mais velhas pelos seus rostos envelhecidos e que carregam filhos na barriga que fatalmente engrossarão os contingentes de criminosos, drogados etc. Essas gestantes tão jovens sabem disso, mas o instinto maternal é suplantado pela “fissura” pela droga.
Entretanto, o vício poderia ser usado contra si mesmo, pois se os viciados fazem tudo pelo crack, por exemplo, basta lhes oferecer um local para consumi-lo sem terem que roubar, se prostituir etc. Nesse local, concomitantemente ao fornecimento de drogas haveria todo um trabalho psicológico e químico de desintoxicação, além de capacitação profissional. E que seria estendido a quem quisesse.
As experiências nesses países mais desenvolvidos como Alemanha, Holanda, Austrália e tantos outros mostram que, aos poucos, os viciados vão se deixando seduzir pela possibilidade de se reinserirem na sociedade. Nos países em que a política de Redução de Danos foi implantada de forma séria, com recursos suficientes, os gastos com saúde pública e com segurança diminuíram e, mais importante, o contingente de viciados também diminuiu consistentemente.
Por que não se faz isso no Brasil? Porque ninguém quer enfrentar uma sociedade atrasada, ignorante e preconceituosa que acha que a solução para esse drama é espancar ou até matar traficantes e suas vítimas – ou, na melhor das hipóteses, confiná-las em celas superlotadas ou guetos para não terem que olhar para o que a ignorância produz.
Então, leitor, saiba que solução existe. Ironicamente, no médio prazo seria mais barata do que essas dispendiosas operações policiais como a que está em curso na Cracolândia de São Paulo ou do que cuidar dos problemas gravíssimos de saúde que sobrecarregam o SUS quando os piores efeitos do consumo de drogas já se fazem sentir.
Há dinheiro para adotar essa solução e ela funciona, mas o país não a adota. Por que? Política, meu caro leitor. É a mesma coisa com o aborto. Todos sabem que é uma hipocrisia proibi-lo porque é praticado  à larga em todo território nacional, mas a lei funciona como uma espécie de venda social para a realidade.
Devido à covardia dos políticos e da imprensa, o debate sobre Redução de Danos jamais prosperou. Temem a escandalização que a proposta geraria entre os setores conservadores, que são maioria. Então nem tentam explicar. Uma campanha bem feita, porém, mostraria as vantagens dessa política pública. Mas quem terá coragem de empreendê-la?