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Covardia político-midiática veta única solução real para o crack




O desastre que a operação policial na Cracolândia de São Paulo encerra transtorna a vida da capital paulista e envergonha a cidade, o Estado e até o país, pois revela a mentalidade atrasada da sociedade brasileira e a covardia da nossa classe política e até da imprensa, que sabem que existe uma solução para o problema das drogas, mas a ignoram e escondem.
No mundo inteiro, a drogadição é uma tragédia. Contudo, alguns países – os mais avançados em termos sócio-econômicos – conseguiram reduzir drasticamente essas chagas sociais com políticas públicas realistas, dentre as quais sobressai a Política de Redução de Danos, representada pelas “narcossalas” ou “salas de uso seguro”.
A XXI Conferência Internacional de Redução de Danos, realizada no ano passado em Liverpool, na Inglaterra, expôs os avanços que as nações mais civilizadas do planeta alcançaram na questão das drogas através do uso das narcossalas, e se debruçou sobre a imperiosidade de expandir essa política pública para regiões menos desenvolvidas como a América Latina, nas quais sociedades conservadoras obrigam a classe política a adotar repressão e violência contra usuários de drogas.
O baixo nível cultural e educacional dos povos latino-americanos, entre outros, não se restringe às classes populares. As elites econômicas vibram com operações policiais truculentas por confundirem políticas de segurança publica reais e efetivas com vingança contra criminosos e até contra as principais vítimas do tráfico, os usuários.
A incompetência desumana da ação policial em São Paulo, na Cracolândia, onde o governo do Estado e a prefeitura da capital decidiram pela técnica de “sufoco, dor e sofrimento” contra pessoas mentalmente doentes e que não têm mais nada a perder na vida, exibe o assustador despreparo das autoridades locais e até da grande imprensa.
A conferência sobre redução de danos que teve lugar na Europa, ano passado, contabilizou o extremo sucesso dessa política pública que consiste na implantação de centros para viciados nos quais recebem drogas –  ou substâncias alternativas que produzem os mesmos efeitos da droga convencional, mas fazem menos mal – para consumo controlado e assistido e podem recorrer a tratamento de desintoxicação, se quiserem.
Vejam só o que ocorre na Cracolândia paulistana. Nem sob ameaça de uma polícia truculenta, mal-paga, inculta, despreparada e corrupta os viciados se intimidam. A “fissura” pela droga já se tornou a razão da existência desses seres humanos, de forma que não há nada mais assustador para o viciado em crack do que não ter como se drogar. Violência policial não intimida essas pessoas.
Por isso, na abertura da 21ª edição da conferência sobre Redução de Danos o sociólogo especializado em saúde pública Gerry Stimson, atual diretor da International Harm Reduction Association (IHRA), que organiza a conferência, considerou que o grande desafio hoje é conscientizar sociedades conservadoras do Terceiro Mundo.
Ano passado, a Conferência relatou que há hoje 93 países e territórios no mundo que adotaram a Redução de Danos. No entanto, em certos países em que o conceito foi adotado os resultados não foram tão bons porque os recursos investidos foram insuficientes. Esse é o grande erro, pois economizam recursos de um lado (na estrutura da Redução de Danos) e gastam em outro (no combate ao tráfico e na assistência médica aos viciados em estado terminal).
Vemos como os usuários de crack em São Paulo não se deixam intimidar ou convencer. Apanham, são escorraçados, humilhados, ameaçados e mesmo assim não cedem e nem cogitam fazê-lo simplesmente porque não podem, pois não há tortura maior para seus corpos e mentes do que ficar sem droga para consumir.
O mais trágico que a covardia da classe política gera pode ser visto nas meninas, algumas pré-adolescentes que parecem mais velhas pelos seus rostos envelhecidos e que carregam filhos na barriga que fatalmente engrossarão os contingentes de criminosos, drogados etc. Essas gestantes tão jovens sabem disso, mas o instinto maternal é suplantado pela “fissura” pela droga.
Entretanto, o vício poderia ser usado contra si mesmo, pois se os viciados fazem tudo pelo crack, por exemplo, basta lhes oferecer um local para consumi-lo sem terem que roubar, se prostituir etc. Nesse local, concomitantemente ao fornecimento de drogas haveria todo um trabalho psicológico e químico de desintoxicação, além de capacitação profissional. E que seria estendido a quem quisesse.
As experiências nesses países mais desenvolvidos como Alemanha, Holanda, Austrália e tantos outros mostram que, aos poucos, os viciados vão se deixando seduzir pela possibilidade de se reinserirem na sociedade. Nos países em que a política de Redução de Danos foi implantada de forma séria, com recursos suficientes, os gastos com saúde pública e com segurança diminuíram e, mais importante, o contingente de viciados também diminuiu consistentemente.
Por que não se faz isso no Brasil? Porque ninguém quer enfrentar uma sociedade atrasada, ignorante e preconceituosa que acha que a solução para esse drama é espancar ou até matar traficantes e suas vítimas – ou, na melhor das hipóteses, confiná-las em celas superlotadas ou guetos para não terem que olhar para o que a ignorância produz.
Então, leitor, saiba que solução existe. Ironicamente, no médio prazo seria mais barata do que essas dispendiosas operações policiais como a que está em curso na Cracolândia de São Paulo ou do que cuidar dos problemas gravíssimos de saúde que sobrecarregam o SUS quando os piores efeitos do consumo de drogas já se fazem sentir.
Há dinheiro para adotar essa solução e ela funciona, mas o país não a adota. Por que? Política, meu caro leitor. É a mesma coisa com o aborto. Todos sabem que é uma hipocrisia proibi-lo porque é praticado  à larga em todo território nacional, mas a lei funciona como uma espécie de venda social para a realidade.
Devido à covardia dos políticos e da imprensa, o debate sobre Redução de Danos jamais prosperou. Temem a escandalização que a proposta geraria entre os setores conservadores, que são maioria. Então nem tentam explicar. Uma campanha bem feita, porém, mostraria as vantagens dessa política pública. Mas quem terá coragem de empreendê-la?

Se não fosse trágico seria cômico!


Sorria, você está sendo curado







Sei que estou comprando uma briga, e o faço em nome pessoal, sem sequer conversar sobre o assunto com o titular deste blog.
Porque jornalista que só escreve o que o chefe manda, é escriba, não jornalista.
Tão escandalizante quanto as declarações do sr. Dr. Laco, sem cedilha, chefe de política anti-drogas (?) do Governo paulista, de que usará “dor e sofrimento” como forma de levar os viciados em crack a buscarem tratamento, tão escandalizante quando a polícia paulista estar, esta tarde, atirando bombas contra os zumbis drogados que tentam voltar à Cracolândia é a falta de reação da “inteligência” paulistana e brasileira a este espetáculo dantesco.
Nós, que temos 50 anos, que convivemos na juventude  com a generalização da droga, que podíamos ou podemos ter um filho ou uma filha ali, doentes e consumidos por uma situação assim, estamos assistindo silentes a este espetáculo terrível.
Segundo a Folha, diz a própria PM que “havia, na cracolândia da rua Helvétia, 60 crianças e 20 grávidas”.
É a eles, inclusive, que queremos impingir “dor e sofrimentos”, além de bombas?
Não vemos a OAB, o Sindicato dos Médicos, ninguém levantando a voz contra o fato de, segundo os próprios jornais, a dispersão dos viciados da Cracolândia estar sendo feita essencialmente com porretes – e digo que, aí, os policiais são até os menos culpados, porque eles próprios sabem que isso é uma pantomima – e não com assistência médica e social.
Os viciados da cracolândia podem agir como bichos irracionais, porque estão corroídos por uma dependência que lhes tira a razão e a ponderação. Nós é que não temos o direito de agir como bichos.
Muito menos se essa ação espalhafatosa é puro marketing, destinada a cenas no Jornal Nacional que produzam imagem de um “combate à droga”  que é, antes, promoção da imagem da “autoridade” do que um ataque real ao problema.
Uma sociedade à qual falta a compaixão, à qual o medo de dizer que aquilo que fere a dignidade humana jamais pode ser feito por ninguém, mas muito menos pelo Estado, que a todos nos representa está mais doente do que aqueles pobres drogados.
Porque nós estamos lúcidos e sabemos discernir o certo do errado.
Ou não sabemos mais? Ou não somos mais viciados em  amar o próximo?

Postado por Fernando Brito no Blog O Tijolaço em 05/01/2012