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Rubens Casara : No Estado pós-democrático, Justiça vira ferramenta contra os “indesejáveis” e serve de mercadoria para entreter o público



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Luiz Carlos Azenha



Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais e Juiz de Direito do TJ/RJ. Ele está lançando o livro Estado Pós-Democrático, neo-obscurantismo e gestão dos indesejáveis. Falou ao Viomundo em sua casa, no Rio de Janeiro.


Trechos:

Esse livro nasce da percepção de uma mutação no Estado. O Estado democrático de Direito, que era marcado pelo existência de limites rígidos para o exercício do poder, esse Estado desaparece e surge uma nova configuração, no qual não existem mais limites rígidos.

Os direitos e garantias fundamentais, dentro da lógica neoliberal, também são tratados como mercadorias e, portanto, negociáveis.

O Estado pós-democrático reúne características que poderiam ser chamadas de pré-modernas.

Há, de novo, uma união entre o poder político e o poder econômico, eles quase se identificam e para que o projeto neoliberal se concretize é necessário um Estado forte.

Um Estado forte na contenção dos indesejáveis.

Os indesejáveis seriam aqueles que não interessam à sociedade de consumo, porque não produzem ou porque não consomem, mas também aqueles inimigos políticos, aqueles que se opõem ao projeto neoliberal.

O que é “processo penal do espetáculo”, tema de seu livro anterior? É aquilo a que estamos assistindo no Brasil hoje?

É uma consequência da razão neoliberal condicionando a atuação dos atores jurídicos. Condicionando a percepção e a exploração do processo como mercadoria.

Se o processo na tradição liberal tinha uma função de garantir o respeito aos direitos e garantias fundamentais, o processo penal do espetáculo aparece com uma dimensão de entretenimento.

É vendido ao grande público como espetáculo e tem como função agradar aos espectadores.

Para saber o que o juiz Casara pensa sobre as ações de seu colega Sérgio Moro, assista à íntegra do vídeo.






Postado em Viomundo em 07/10/2017



Rubens Casara


" O brasileiro foi levado a acreditar no uso da força, da violência, para resolver os mais variados problemas. Você é levado a acreditar que as coisas não podem ser diferentes, a esquecer a ideia de utopia e nesse momento fica paralisado diante de um estado de coisas que não necessariamente tinha que ser assim.

Se o fascismo já foi visto como obstáculo ao capitalismo, hoje é fundamental para a manutenção do modelo, que está em crise permanente – e se é permanente, nem merece ser chamado de crise, é o próprio funcionamento normal do sistema.

Práticas fascistas são fundamentais nesse controle da população e na formatação de um pensamento homogêneo que é interessante para a sociedade de consumo, já que a diferença no contexto do Estado Pós-Democrático, para a razão neoliberal, só é admitida se puder ser transformada em mercadoria. As outras diferenças podem ser eliminadas.

Hoje, a sensação que nos domina é de angústia, de falta, de impotência, e identificar – e aceitar até – essa angústia e fazer algo criativo a partir dela passa necessariamente por um processo que chamo de auto interpretação. 

Temos que nos interpretar, saber o que queremos, verificar qual a nossa responsabilidade pelo que estamos vivendo e partir para a ação. Iniciar um processo de mudança, ou que seja apenas para caminhar. Hoje nós não estamos andando.

Uma característica marcante da pós-democracia é que começamos a querer trabalhar só com positividades, é a sociedade do excesso do desempenho, onde cada um tem que produzir muito, não sobra tempo para o diálogo. E temos que conversar muito para pensar soluções para as inércias tanto coletivas quanto individuais.

E o autoritarismo pretende também impedir esse diálogo.

O ódio é produzido para você não conversar com o outro. Se não existe o diálogo, não existe o comum. Cada um pensando no seu próprio umbigo não se tem perspectiva de transformação."




Carol Proner fala ao Cafezinho sobre livro que questionará sentença de Moro



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Miguel do Rosário



O nosso correspondente na Suécia, Wellington Calasans, está no Brasil fazendo uma série de entrevistas para o Cafezinho. 

Assista abaixo o vídeo que ele fez com Carol Proner, professora de Direito da UFRJ, e uma das coordenadoras do livro coletivo, com participação de uma centena de juristas, que discute a sentença de Sergio Moro que condenou Lula.







Postado em O Cafezinho em 26/07/2017



Aula Pública : Bibliodiversidade



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O livro é a principal forma de transmissão de conhecimento aprofundado numa sociedade.

A pluralidade de publicações garante o equilíbrio entre as diferentes vozes que participam do debate e da construção do conhecimento.

O crescimento de grandes corporações e a adoção de políticas agressivas de marketing, no entanto, ameaçam a diversidade editorial.

Nas livrarias, as editoras pequenas e médias encontram cada vez menos espaço de exposição, que agora é vendido para as grandes corporações do setor, como já acontecia nos supermercados.

O resultado é a diminuição de publicações independentes e plurais nas livrarias.

Mas por que é tão importante buscar o equilíbrio e a pluralidade no mercado de livros?​


Convidado: Haroldo Ceravolo Sereza

Jornalista e editor de livros. Diretor de redação do portal Ópera Mundi.
Ex-presidente da Liga Brasileira de Editora, a LIBRE.












Lula : Globo tirou a Dilma do ar ! Eles querem é entregar o pré-sal !






A presidente afastada Dilma Rousseff foi à Universidade de Brasília (UnB), por volta das 20h desta segunda-feira (30/5), para participar do lançamento do livro A resistência ao golpe de 2016.


A obra reúne, em 450 páginas, textos sobre o processo de impeachment. Na chegada, Dilma foi ovacionada e recebida com gritos de “fora, Temer” e “volta, Dilma”.





Dilma fez um discurso, no qual condenou, mais uma vez, o impeachment sem crime de responsabilidade. 
“Há silêncio constrangedor quando falam da minha saída. Nos áudios, não vejo frases a respeito de créditos suplementares”, disse a presidente afastada.


O livro conta com textos escritos por advogados, professores, políticos, jornalistas, cientistas políticos, líderes de movimentos sociais, e mais. 

Entre os participantes há nomes como Guilherme Boulos, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Leonardo Boff, teólogo e escritor, e o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos.



O desafio de conversar com um fascista




Rubens Casara 


Em Adorno, a ignorância, a ausência de reflexão, a identificação de inimigos imaginários, a transformação dos acusadores em julgadores (e vice-versa) e a manipulação do discurso religioso são, dentre outros sintomas, apontados como típicos do pensamento autoritário.

Pensem, agora, na naturalização com que direitos fundamentais são afastados e violados no Brasil, na crença no uso da força (e do sistema penal) para resolver os mais variados problemas sociais, na demonização de um partido político (que, apesar de vários erros, e ao contrário de outros partidos apontados como “democráticos”, não aderiu aos projetos a seguir descritos), no prestígio novamente atribuído aos “juízes-inquisidores”, nos recentes linchamentos (inclusive virtuais), no número tanto de pessoas mortas por ação da polícia quanto de policiais mortos e nos projetos legislativos que:

a) relativizam a presunção de inocência; 

b) ampliam as hipóteses de “prisão em flagrante” em evidente violação aos limites semânticos da palavra “flagrante” inscrita no texto Constitucional como limite ao exercício do poder; 

c) criminalizam os movimentos sociais com a desculpa de prevenir “atos de terrorismo”; 

d) impedem o fornecimento de “pílulas do dia seguinte” para profilaxia de gravidez decorrente de violência sexual e criminalizam médicos que dão informações para mulheres vítimas de violência sexual;

e) eliminam o princípio constitucional da gratuidade na educação pública, dentre outras aberrações jurídicas.

Conclusão? Avança-se na escala do fascismo.

O fascismo recebeu seu nome na Itália, mas Mussolini nunca esteve sozinho. Diversos movimentos semelhantes surgiram no pós-guerra com a mesma receita que unia voluntarismo, pouca reflexão e violência contra seus inimigos. 

Hoje, parece que há consenso de que existe(m) fascismo(s) para além do fenômeno italiano ou, ainda, que o fascismo é um amálgama de significantes, um “patrimônio” de teorias, valores, princípios, estratégias e práticas à disposição dos governantes ou de lideranças de ocasião (que podem, por exemplo, ser fabricadas pelos detentores do poder político ou econômico, em especial através dos meios de comunicação de massa), que disseminam o ódio contra o que existe para conquistar o poder e/ou impor suas concepções de mundo.

O fascismo possui inegavelmente uma ideologia: uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classes, etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência de saber.

Os fascistas, como já foi dito, talvez não saibam o que querem, mas sabem bem o que não suportam. Não suportam a democracia, entendida como concretização dos direitos fundamentais de todos, como processo de educação para a liberdade e de limites ao exercício do poder.

Essa mistura de pouca reflexão (o fascismo, nesse particular, aproxima-se dos fundamentalismos, ambos marcados pela ode à ignorância) e recurso à força (como resposta preferencial para os mais variados problemas sociais) produz reflexos em toda a sociedade.

As práticas fascistas revelam uma desconfiança. O fascista desconfia do conhecimento, tem ódio de quem demonstra saber algo que afronte ou se revele capaz de abalar suas crenças.

Ignorância e confusão pautam sua postura na sociedade. O recurso a crenças irracionais ou anti-racionais, a criação de inimigos imaginários (a transformação do “diferente” em inimigo), a confusão entre acusação e julgamento (o acusador – aquele indivíduo que aponta o dedo e atribui responsabilidade – que se transforma em juiz e o juiz que se torna acusador – o inquisidor pós-moderno) são sintomas do fascismo que poderiam ser superados se o sujeito estivesse aberto ao saber, ao diálogo que revela diversos saberes.

Diante dos riscos do fascismo, o desafio é confrontar o fascista com aquilo que para ele é insuportável: o outro. O instrumento? O diálogo, na melhor tradição filosófica atribuída a Sócrates.

Talvez esse seja o objetivo do diálogo proposto pela filósofa Marcia Tiburi em seu novo livro, que tive o prazer de apresentar (o prefácio é do sempre excelente Jean Wyllys).

Em “Como conversar com um fascista: reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro” (Rio de janeiro: Record, 2015), a autora resgata a política como experiência de linguagem, sempre presente na vida em comum, e investe nessa operação, que exige o encontro entre o “eu” e o “tu”, apresentada como fundamental à construção democrática.

De fato, a qualidade e a própria existência da forma democrática dependem da abertura ao diálogo, da construção de diálogos genuínos – que não se confundem com monólogos travestidos de diálogos – em que a individualidade e os interesses de cada pessoa não inviabilizam a construção de um projeto comum, de uma comunidade fundada na reciprocidade e no respeito à alteridade.

Ao tratar da personalidade autoritária, dos micro-fascismos do dia-a-dia, do consumismo da linguagem, da transformação de pessoas em objetos, da plastificação das relações, da idiotização de parcela da população, dentre outros fenômenos perceptíveis na sociedade brasileira, Marcia Tiburi sugere uma mudança de atitude do um-para-com-o-outro.

Nos diversos ensaios deste livro, a autora conduz o leitor para um processo de reflexão e descoberta dos valores democráticos, bem como desvela as contradições, os preconceitos e as práticas que caracterizam os movimentos autoritários em plena democracia formal.

Mas, não é só.

Ao propor que a experiência dialógica alcance também os fascistas, aqueles que se recusam a perceber e aceitar o outro em sua totalidade, Marcia Tiburi exerce a arte de resistir.

Dialogar com um fascista, e sobre o fascismo, forçar uma relação com um sujeito incapaz de suportar a diferença inerente ao diálogo, é um ato de resistência. Confrontar o fascista, desvelar sua ignorância, fornecer informação/conhecimento, levar esse interlocutor à contradição, desconstruindo suas certezas, forçando-o a admitir que seu conhecimento é limitado, fazem parte do empreendimento ético-político da autora, que faz neste livro uma aposta na potência do diálogo e na difusão do conhecimento como antídoto à tradição autoritária que condiciona o pensamento e a ação em terra brasilis.

O leitor, ao final, perceberá que não só o objetivo foi alcançado como também que a autora nos brindou com um texto delicioso, original, profundo sem ser pretensioso. Mais do que recomendada a leitura.


Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ, Coordenador de Processo Penal da EMERJ e escreve a Coluna ContraCorrentes, aos sábados, com Giane Alvares, Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano.



Postado no Pragmatismo Político em 05/02/2016


Decorando com aparadores de livros
















































Parabéns, atingimos a burrice máxima




Por Eliane Brum, na edição brasileira do jornal El País


A fogueira de Simone de Beauvoir a partir da questão do ENEM mostrou que a burrice se tornou um problema estrutural do Brasil. Se não for enfrentada, não há chance. Hordas e hordas de burros que ocupam espaços institucionais, burros que ocupam bancadas de TV, burros pagos por dinheiro público, burros pagos por dinheiro privado, burros em lugares privilegiados, atacaram a filósofa francesa porque o Exame Nacional de Ensino Médio colocou na prova um trecho de uma de suas obras, O Segundo Sexo, começando pela frase célebre: “Uma mulher não nasce mulher, torna-se mulher”. Bastou para os burros levantarem as orelhas e relincharem sua ignorância em volumes constrangedores. 

Debater com seriedade a burrice nacional é mais urgente do que discutir a crise econômica e o baixo crescimento do país. A burrice está na raiz da crise política mais ampla. A burrice corrompe a vida, a privada e a pública. Dia após dia.

Recapitulando alguns espasmos do mais recente surto de burrice. O verbete de Simone de Beauvoir (1908-1986) na Wikipedia, conforme mostrou uma reportagem da BBC, foi invadido para tachar a escritora de “pedófila” e “nazista”. A Câmara de Vereadores de Campinas, no estado de São Paulo, aprovou uma “moção de repúdio” à filósofa. O deputado Marco Feliciano (PSC-SP), da Bancada da Bíblia, descobriu na frase “uma escolha adrede, ardilosa e discrepante do que se tem decidido sobre o que se deve ensinar aos nossos jovens”. Em sua página no Facebook, o promotor de justiça do município paulista de Sorocaba, Jorge Alberto de Oliveira Marum, chamou Beauvoir de “baranga francesa que não toma banho, não usa sutiã e não se depila”. 

Como o tema da redação do ENEM era “a persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”, houve gente que estudou em colégios caros afirmando que este era um tema de esquerda, e portanto um sinal inequívoco de uma conspiração ideológica por parte do governo federal. 

Como sugeriu o crítico de cinema Inácio Araújo em seu blog, se defender que a mulher tenha o direito de andar sem ser perturbada, agredida e chutada é tema de esquerda, isso só pode significar que a direita vai muito mal.

Está cada vez mais difícil fazer humor no Brasil. Como nada do que foi relatado acima é piada, somos submetidos cotidianamente a uma experiência de perversão. Também não tem sido fácil escrever quando não se é humorista, por que o que se pode dizer, seriamente, diante de uma moção de repúdio à Simone de Beauvoir?

Mas é preciso tratar com seriedade, porque talvez não exista nada mais sério do que a boçalidade que atravessa o país. Torna-se urgente, prioritário, fazer um esforço coletivo e enfrentar a burrice com o único instrumento capaz de derrotá-la: o pensamento. 

Esta é a potência e a generosidade de um livro lançado pela filósofa Marcia Tiburi, escritora e professora universitária. O título vai direto ao ponto, afinal os tempos são graves demais para papinhos de salão: Como conversar com um fascista – reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro (Record). 

Nas 194 páginas, Marcia enfrenta as várias faces do cotidiano atual com profundidade, mas de forma acessível a quem não está familiarizado com os conceitos. Faz o mais difícil: escrever simples sem simplificar. É um livro que se pretende para todos, e não para os seus pares. Quem acompanha a trajetória da filósofa conhece a sua coragem. E este é um livro de coragem, já que é tão difícil quanto arriscado escrever sobre o que está em movimento, sem a proteção assegurada pelo distanciamento histórico. Poucos são os intelectuais que se arriscam a sair do conforto de seus feudos para enfrentar o debate público com suas dúvidas. E por isso aqueles que se arriscam de forma honesta, sem ficar arrotando suas certezas e suas credenciais, ou usando-as para massacrar aqueles que já são massacrados, são tão preciosos.

“Eu queria saber por que dialogar é impossível”, conta Marcia Tiburi, sobre a pergunta que a moveu nessa busca. Para enfrentar a ausência do pensamento, a filósofa propõe a resistência pelo diálogo. Este é um esforço de cada um – e de todos. Arriscar-se a deixar o “isolamento em comunidade”, a forma atual da vida social e política, para confrontar o que ela chama de “consumismo da linguagem”. 

Compreender o confronto atual como um confronto entre direita e esquerda, desenvolvimentistas e ecologistas, governistas e oposicionistas, machistas e feministas é, segundo ela, uma redução. O confronto atual seria mais profundo e também mais dramático: entre os que pensam e os que não pensam.

O exercício que faço, deste parágrafo em diante, é buscar compreender a fogueira em que Simone de Beauvoir foi jogada nos últimos dias, entre outros fatos recentes, a partir das ideias deste livro. 

Para começar, a seriedade do episódio do ENEM pode ser demonstrada neste trecho tão agudo: “Se levarmos em conta que falar qualquer coisa está muito fácil, que falamos em excesso e falamos coisas desnecessárias, um novo consumismo emerge entre nós, o consumismo da linguagem. O problema é que ele produz, como qualquer consumismo, muito lixo. E o problema de qualquer lixo é que ele não retorna à natureza como se nada tivesse acontecido. Ele altera profundamente nossas vidas em um sentido físico e mental. O que se come, o que se vê, o que se ouve, numa palavra, o que se introjeta, vira corpo, se torna existência”.

Vale perguntar. Num país em que a preocupação com a educação é uma flatulência, em que a não educação é a regra, para onde vai o lixo e que tipo de impacto ele produz na tessitura do cotidiano, nos corações e mentes de quem o consome? O que acontece com a fogueira de Simone de Beauvoir num contexto em que aqueles que a jogaram no fogo possivelmente sequer a leram? Que restos dos discursos vazios sobre a filósofa permanecerão na memória de uma população que não tem seus livros na estante e que tipo de eco produzirão?

Como dimensionar a gravidade de um vereador eleito, pago com dinheiro público para legislar e, portanto, para decidir destinos coletivos, dizer que a escolha da frase de Simone de Beauvoir para uma prova do ENEM é algo “demoníaco”, como afirmou Campos Filho (DEM)? E como enfrentá-la com a seriedade necessária?

Com a palavra, o autor da “moção de repúdio”: “Foram buscar lá Simone de Beauvoir, lá pro ano de mil trocentos e pôco.... (...) A grande maioria é favorável à lei da natureza. Homem é homem. Mulher é mulher. (...) Cuidado com essa pulsão, essa pulsão pode levar à cadeia. O senhor pode passar na frente do caixa eletrônico e ter uma pulsão de vontade de roubar e vai preso. Pode ter uma pulsão de vontade de estuprar e vai preso. Então, tomem cuidado com essa pulsão, ah, hoje de manhã sou menina, agora à noite eu sou homem....”. 

O vereador nem sequer sabe em que século Simone de Beauvoir nasceu, viveu e produziu pensamento – “miltrocentos e pôco”. Nem sequer tentou compreender o que a frase citada no ENEM significa. Não é engraçado. É a ruína causando mais ruína. O que interessa é fazer barulho, porque o barulho encobre o vazio de ideias. 

O que importa é perverter a palavra, usando o que sequer tentou entender para enclausurar o pensamento e reafirmar a certeza em nome de uma suposta “lei da natureza” que jamais existiu.

A perversão do fascista é a de acusar o outro de manipulação ideológica quando é ele o manipulador. É acusar o outro de impor um pensamento quando é ele que empreende todo os esforços para barrar qualquer pensamento. É impedir o diálogo denunciando o outro pelo ato que ele próprio cometeu. É nessa repetição de boçalidades que seguem os discursos de outros vereadores, invocando clichês bíblicos, lembrando de Sodoma e Gomorra e Adão e Eva, abusando de Deus.

Para perverter a realidade, o fascista conta com o consumismo da linguagem. Trata-se, como aponta Marcia Tiburi, de um vazio repleto de falas prontas. Não é um vazio silencioso, espaço aberto para buscar o outro, o inusitado, o surpreendente. Mas sim um vazio barulhento, abarrotado de clichês, de frases repetidas e repetitivas, usadas para se proteger do pensamento. Os lugares-comuns, neste caso específico a constante invocação de Deus e de leis bíblicas, são usados como um escudo contra a reflexão. Todo o esforço é empreendido para não existir qualquer chance de pensamento, ainda que um bem pequenino.

Neste vazio, a filósofa acredita que os meios tecnológicos e a mídia desempenham um papel crucial. 

Repete-se o que é dito na TV, no rádio. Fala-se, muito, sem pensar no que se diz. No gesto do mero “compartilhar” sem ler, tão fácil quanto comprar com um clique pela internet, foge-se do pensamento analítico e crítico, trocando-o pelo vazio consumista da linguagem e da ação repetitiva.

É assim que a burrice se multiplica em cliques, propagando-se em rede. O título deste artigo é esperançoso, mas não corresponde à realidade: a burrice não tem limites, ela sempre pode atingir patamares ainda mais extremos.

Episódios semelhantes à “moção de repúdio” à Simone de Beauvoir ocorriam esporadicamente em rincões afastados, e logo eram ridicularizados. Hoje, acontecem na Câmara de Vereadores de uma das maiores e mais ricas cidades do estado de São Paulo, no sudeste do Brasil, uma cidade que abriga várias universidades, entre elas a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), uma das mais respeitadas do país.

E cadê os intelectuais? Rindo dos burros nas cantinas universitárias? Será? Não era de se esperar mais iniciativas de busca do diálogo, de criação de oportunidades para explicar quem é Simone de Beauvoir e refletir sobre sua obra, ou mesmo a ocupação da Câmara, para produzir reação e movimento que permitisse o conhecimento e combatesse a ignorância?

Talvez o polêmico livro Submisssão (Alfaguara), do francês Michel Houellebecq, possa ter alguma ressonância maior por aqui. Nele, só para lembrar, o protagonista é um acadêmico desencantado que se depara com a vitória de um partido islâmico nas eleições da França. Depois de assistir ao desenrolar dos acontecimentos pela TV, já que não se sente motivado a participar de nenhum debate que não seja sobre a sua própria tese acadêmica (ou nem mesmo sobre ela), se choca com o resultado eleitoral. É o protagonista que não protagoniza –ou só protagoniza por omissão (ou submissão). Aos poucos, os novos donos do poder lhe acenam não só com a manutenção dos privilégios, mas com uma considerável ampliação dos privilégios. E ele, afinal, conclui que aderir pode não ser tão ruim assim.

Os burros estão por toda parte e muitos deles estudaram nas melhores escolas e, o pior, muitos ensinam nas melhores escolas. A “moção de repúdio” à Simone de Beauvoir foi aprovada pela Câmara de Campinas por 25 votos a cinco. Assim, os burros são a maioria.

É preciso enfrentá-los com pensamento, fazer a resistência pelo diálogo. Ou, como diz Marcia Tiburi: “Sem pensamento não há diálogo possível nem emancipação em nível algum. Se não houver limites para a idiotice, resta isolar-se e estocar alimentos”.

O promotor e professor universitário que reduziu Simone de Beauvoir a “uma baranga”, ao comentar a questão do ENEM em sua página no Facebook, fez o seguinte comentário: “Exame Nacional-Socialista da Doutrinação Sub-Marxista. Aprendam jovens: mulher não nasce mulher, nasce uma baranga francesa que não toma banho, não usa sutiã e não se depila. Só depois é pervertida pelo capitalismo opressor e se torna mulher que toma banho, usa sutiã e se depila”. Depois da repercussão negativa, o que incluiu uma nota de repúdio por parte da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Jorge Alberto de Oliveira Marum apagou os posts e defendeu-se, em outra postagem, alegando que pretendia ter sido irônico: “Ironia, para quem não sabe, é uma figura de linguagem que consiste em afirmar o contrário do que se pensa”. Interprete-se.

“Distorcer é poder” é o título de um dos capítulos do livro em que a filósofa enfrenta a prática amplamente difundida de esvaziar as palavras pela distorção. Como transformar a vítima em culpada, como se faz rotineiramente com as mulheres no falso debate do aborto, por exemplo, ou no tratamento do estupro. 

Ou distorcer para que aquele que detém os privilégios pareça ser o que têm seus direitos ameaçados: o branco, por exemplo, quando se apresenta como prejudicado pelo sistema de cotas raciais que busca reparar injustiças históricas cometidas contra os negros, ocultando assim que sempre foi o privilegiado; ou quando se invoca um suposto “orgulho heterossexual” na tentativa de mascarar a violência contra os homossexuais, alegando que querem privilégios, quando todos sabem que a heterossexualidade jamais foi contestada ou atacada, nem em sua expressão nem em seus direitos. E também é por essa conversão que os manifestantes de junho de 2013 foram tachados de “vândalos” por parte da mídia e, hoje, uma lei em discussão no Congresso ameaça converter quem protesta em “terrorista”.

A própria “democracia” pode ser vista a partir da prática da distorção, já que há aquela, mais difundida, que é vendida pelo mercado. “De um lado, há uma democracia que deve parecer como realizada, contra outra democracia, que está na ordem do desejo e do sonho e que não teria preço”. O capitalismo sequestra a democracia também como palavra, que passa a ser consumida, junto com outras: felicidade, ética, liberdade, oportunidade, mérito. Palavras que a filósofa chama de “mágicas”, invocadas a serviço do ocultamento da opressão. “Antidemocrático, o capitalismo precisaria ocultar sua única democracia verdadeira: a partilha da miséria e, hoje em dia, cada vez mais, a matabilidade”, afirma Marcia Tiburi.

Quando se invade o verbete de Simone de Beauvoir na Wikipedia é também disso que se trata: distorcer e replicar até virar “verdade”. Aliena-se os fatos de seu contexto histórico para produzir rótulos. Assim, após o ENEM, a filósofa foi tachada de “pedófila” e de “nazista”. Ambas as afirmações já foram retiradas da página pelo responsável, avisando que a manteria fechada até “que o furor acabasse e as pessoas perdessem o interesse em danificar o artigo”.

Entre as dezenas de distorções do verbete, segundo a matéria da BBC, um usuário disse que a filósofa havia escrito um "livro de estupro". Outro informou que Beauvoir era uma "antifeminista". Um terceiro disse ainda que ela era "muito conhecida por seu comodismo e pela luta na justiça por uma lei que proibia o trabalho das mulheres fora de casa”.

As distorções servem à reprodutibilidade da burrice. Ao converter a filósofa no que é interpretado como o mais monstruoso – “pedófila” e “nazista” – o objetivo é tornar impossível refletir sobre o que ela escreveu: “uma mulher não nasce mulher, torna-se mulher”. A ampla distorção das palavras serve, de novo, ao vazio do pensamento. 

Pede-se aos burros que a repliquem à exaustão em cliques histéricos. A linguagem, como escreve Marcia Tiburi, tem sido rebaixada à distribuição da violência – também pelos meios de comunicação e pelas redes sociais. “Vivemos no império da canalhice, onde a burrice, tanto como categoria cognitiva quanto moral, venceu”, afirma. “Ela se transformou no todo do poder.”

Aderir é viver. Esta parece ser a frase deste momento de orgulho da ignorância e exaltação da burrice. Aqui, a pergunta se impõe: “se a linguagem nos tornou seres políticos, a destruição da linguagem nos tornará o quê?”.

Na semana passada, foi divulgado na página da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República um estudo que reuniu pesquisadores de diversas instituições, apresentado como o mais completo já feito no Brasil sobre os efeitos da mudança climática.

Refletir seriamente sobre a mudança climática é urgente, mas há muito menos pensamento e ação do que o momento exigiria, apesar de estarmos às vésperas da Conferência do Clima em Paris. Assim, a divulgação de um estudo com as conclusões a que se chegou poderia ser uma oportunidade excelente para promover participação e diálogo.

Mas, entre as tantas previsões que apontaram para um possível drama climático daqui a 25 anos, em 2040 – doenças, calor extremo, falta d’água e de energia etc –, uma foi destacada por diferentes veículos da imprensa: a possível perda de uma área imobiliária avaliada em R$ 109 bilhões no Rio de Janeiro, devido à elevação do nível do mar causada pelo aquecimento global.

Não as perdas humanas, não a corrosão da vida, não o aniquilamento dos mais pobres e dos mais frágeis. Não. O que se destaca é aquilo que se monetariza, é a perda do patrimônio material, no caso imobiliário. O que merece título é o cifrão. 

O episódio evoca um dos capítulos mais interessantes de Como conversar com um fascista: “O capitalismo é a redução da vida ao plano econômico. (...) O pensamento está minado pela lógica do ‘rendimento’. Viver torna-se uma questão apenas econômica. A economia torna-se uma forma de vida administrada com regras próprias, tais como o consumo, o endividamento, a segurança pela qual se pode pagar. Tudo isso é sistêmico e, ao mesmo tempo, algo histérico. (...) As palavras funcionam como estigmas ou como dogmas que sustentam ideias orientadoras de práticas”. Se a ordem do discurso capitalista é basicamente teológica, é porque ele funciona como uma religião no âmbito das escrituras e das pregações (em geral no púlpito tecnológico da televisão)”. Se depois de tanto calarmos sobre a mudança climática, falarmos dela a partir da lógica monetária, estamos todos (mais) perdidos.

Mas é em outro episódio destes últimos dias que a perversão do Brasil atual se revelou em toda a sua monstruosidade: a Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio de Janeiro concluiu em inquérito que o policial que matou um menino de dez anos agiu em “legítima defesa”. Eduardo de Jesus brincava na porta da sua casa, numa das favelas do Complexo do Alemão, quando teve a cabeça atingida por um tiro de fuzil. Sua mãe encontrou parte do seu cérebro na sala. O inquérito isentou de qualquer responsabilidade os policiais envolvidos, por estarem supostamente em confronto com narcotraficantes. Eles teriam apenas “errado” o tiro.

Eduardo estava a cinco metros do policial que o matou. Terezinha de Jesus, a mãe do menino, afirma que não havia tiroteio naquele dia. “Eu parti para cima do policial. Gritei que tinha matado meu filho e ele me respondeu, com seu fuzil na minha cabeça, que igual que tinha matado ele poderia também me matar, porque o menino era filho de bandido. Nunca vou esquecer aquilo. Posso estar em qualquer lugar do mundo, que nunca esquecerei a cara daquele policial”. Ao ser informada por jornalistas que a polícia concluiu que seu filho foi morto em legítima defesa, Terezinha disse que sentia vontade “de quebrar tudo”.

Quando a perversão supera tal limite é porque estamos quase no ponto de não retorno. “Não acabaremos com o ódio pregando o amor”, diz Marcia Tiburi. “Mas agindo em nome de um diálogo que não apenas mostre que o ódio é impotente, mas que o torne impotente.” 

Em Como conversar com um fascista, a filósofa defende a necessidade de começar a tentar falar de outro modo. 

O diálogo não como salvação, mas como experimento, como ativismo filosófico para enfrentar a antipolítica. A política, lembra a autora, “é laço amoroso entre pessoas que podem falar e se escutar não porque sejam iguais, mas porque deixaram de lado suas carapaças de ódio e quebraram o muro de cimento onde suas subjetividades estão enterradas”.

Num país de antipolítica e antieducação generalizada como o Brasil é preciso se mover. É urgente aprender a conversar com um fascista, mesmo que pareça impossível. Expor ao outro aquele que não suporta a diferença. Revelar suas contradições e confrontá-lo pelo diálogo é um ato de resistência. Enfrentar a burrice com a única arma que ela teme: o pensamento.

É isso ou não vai adiantar nem estocar alimentos.


* Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas.
















O Quarto Poder : "Não quero preto e nem desdentado no Jornal Nacional", ordem de Roberto Marinho !






O essencial é invisível aos olhos . . .




Sarah Vianna

É incrível o quanto as pessoas se enganam com as aparências, não é mesmo?

Quem diria que um livro, visualmente infantil, conteria um conteúdo e uma lição que ultrapassa qualquer idade, qualquer geração.

O Pequeno Príncipe é um livro do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, publicado em 1943, nos Estados Unidos.

É um livro fantástico, que desperta a magia e o mistério da infância no coração de todos que lerem atentamente, prova para o mundo, que para ser criança basta imaginar e acreditar naquilo que se imagina, ele reconstrói a ideia de que não envelhecemos, apenas deixamos que a criança que vive dentro de nós, adormeça.
“Mas, com certeza, para nós, que compreendemos o significado da vida, os números não têm tanta importância.” – O Pequeno Príncipe.
Essa história emocionou e emociona até hoje pessoas de todas as idades e de todos os cantos do mundo , ele traz de volta memórias que já haviam sido esquecidas, ele abre os olhos para que os “adultos” observem com mais calma o dia-a-dia, para que consigam olhar as coisas com a mesma bondade e ingenuidade de uma criança.
“Todas as pessoas grandes foram um dia crianças – mas poucas se lembram disso.” – O Pequeno Príncipe
Em 2015, essa história ganha vida novamente, e vai para as telas de cinema, para contar a mesma história, mas com uma abordagem um tanto diferente: Uma garota acaba de se mudar com a mãe, uma controladora obsessiva que deseja definir antecipadamente todos os passos da filha para que ela seja aprovada em uma escola conceituada. Entretanto, um acidente provocado por seu vizinho faz com que a hélice de um avião abra um enorme buraco em sua casa. Curiosa em saber como o objeto parou ali, ela decide investigar. Logo conhece e se torna amiga de seu novo vizinho, um senhor que lhe conta a história de um pequeno príncipe que vive em um asteróide com sua rosa e, um dia, encontrou um aviador perdido no deserto em plena Terra.

Vivemos em um momento em que tudo é superficial e acontece em um instante, as pessoas não enxergam mais as coisas que realmente possuem valor, não dão á devida atenção para aquilo que não pode ser comprado ou vendido , a vida tornou-se comercial. O mundo está de ponta cabeça e ninguém reparou, opa, ninguém não, Antoine de Saint-Exupéry percebeu isso ainda nos anos 40.

Uma das frases do livro que mais me chamou a atenção foi a seguinte: 
“Que planeta engraçado, é completamente seco, pontudo e salgado, os homens não tem imaginação”O Pequeno Príncipe
Essa frase é engraçada, mas muito realista, não nos damos conta que nos deixamos levar pela rotina, nossos dias são todos iguais, “secos, pontudos e salgados”, o lado doce e arriscado da vida sempre acaba ficando para mais tarde, para uma outra hora, um outro momento.

As pessoas precisam voltar a admirar as coisas simples, a observar os gestos da natureza, precisam se apaixonar por olhares e por sorrisos, precisam voltar a ter o poder de amar e não o de amar o poder ,precisam voltar a sonhar, precisam perceber que a vida é curta demais para valorizar as coisas finitas, não podem deixar que a vida, os problemas, a maturidade, o trabalho entediante, faça com que a criança alegre e adormecida dentro de cada um nós, morra.
“Eis o meu segredo: é muito simples, só se vê bem com o coração.” – O Pequeno Príncipe

 Postado no O Segredo





Noite de autógrafos do livro O Quarto Poder – Uma Outra História de Paulo Henrique Amorim



Diferentemente de tantos outros livros do gênero, Paulo Henrique diz que seu novo trabalho não visa incomodar ninguém.— De jeito nenhum. Eu espero que seja um livro que informe,
que dê notícias, que revele episódios e não há de incomodar ninguém. E se
alguma coisa incomoda, é a maneira pela qual hoje alguns órgãos de imprensa utilizam
essa imprensa. Eu me refiro especificamente a esse conglomerado que se organiza
em torno dessa emissora de televisão que está provisoriamente na liderança
(risos)


O lançamento do livro O Quarto Poder – Uma Outra História, nesta quinta-feira (3), reuniu colegas, leitores, telespectadores e algumas das centenas de personalidades entrevistas pelo jornalista. A obra conta os bastidores da imprensa brasileira nas últimas décadas.









A narrativa traz ainda curiosidades, como por exemplo, quanto era o salário de Boni em seu auge na Globo.— O relato apenas comprova que ele valia muito dinheiro e ele de
fato valia muito dinheiro


A livraria estava lotada. Fãs de diversos lugares do Brasil foram à noite de autógrafos para prestigiar Paulo Henrique Amorim


Postado no Conversa Afiada em 04/09/2015


" A Globo nasceu de uma ilegalidade " : Livro O Quarto Poder conta detalhes do surgimento da Rede Globo e de como o governo do ditador Artur da Costa e Silva (1967-1969) salvou a emissora







O jornalista Paulo Henrique Amorim está lançando o livro O Quarto Poder - uma outra história. 


Nele, o apresentador e blogueiro mescla sua trajetória profissional com a história de poder da imprensa brasileira em momentos históricos.

"No Brasil, em muitas circunstâncias, a imprensa é o primeiro poder. A força dela aqui é superior à força que a gente encontra em outras democracias no mundo", afirmou Amorim que chama a reunião dos grandes grupos midiáticos brasileiros de Partido da Imprensa Golpista (PIG).

O nome do criador da Rede Globo, Roberto Marinho é bastante presente no livro. Amorim conta que, diferentemente das publicações antigas sobre Marinho “de bajulação rasteira e vulgar” seu livro mostra bastidores e trata o empresário “com as armas que ele deveria ser tratado”.

Em uma das passagens, Amorim conta qual foi a ordem de Marinho para a equipe de redação da emissora no episódio do debate entre os então presidenciáveis Collor e Lula, no segundo turno em 1989:
 “o que for de melhor do Collor com o que for de pior do Lula”.

O livro também conta detalhes do surgimento da Rede Globo e de como o governo do ditador Artur da Costa e Silva (1967-1969) salvou a emissora, fazendo as estatais comprarem maciças cotas de publicidade.
“A Rede Globo nasceu de uma ilegalidade, financiada por um grupo americano, o Time-Life, o que era proibido pela Constituição. O Roberto Marinho deu uma garantia das posses pessoais dele, sabendo que a Globo receberia uma publicidade a preço de tabela. A Globo vendeu esses espaços para as estatais e pôde comprar a parte do Time-Life e saiu no lucro”, denuncia.

O lançamento do livro é na próxima quinta-feira (3), às 19:30, na Livraria Saraiva do Shopping Higienópolis, em São Paulo (SP).


Postado no Carta Maior em 28/08/2015












Aécio " Dorian Gray " Neves afronta a Democracia


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Jornalista João Paulo Cunha, um dos mais respeitados de Minas Gerais, compara o senador Aécio Neves (PSDB-MG) ao personagem Dorian Gray, de Oscar Wilde.

"Em linhas gerais, o livro narra a história de um homem que leva uma vida dupla. Por obra de um pacto, Dorian tem sua existência voltada para a busca do prazer sem limites. Mesmo assim, mantém a aparência do corpo e as cintilações da virtude, enquanto um retrato a óleo, pintado com sua imagem de corpo inteiro, envelhece e abriga as rugas do tempo e marcas de seus pecados de alma", diz Cunha.

"Aécio Neves tem muito de Dorian Gray. O retrato que o protegeu do peso da realidade foi o fosso criado entre suas ações e a opinião pública"; segundo o jornalista, desde que perdeu as eleições, Aécio teve seu verdadeiro retrato revelado.

"Está colada nele, agora para sempre, uma postura odiosa, iracunda, incapaz de diálogo". Leia a íntegra.

Aécio vem tentando, por todos os meios, adiar a consagração de uma verdade democrática

João Paulo Cunha

Aécio Neves é um personagem ambivalente. Sua indignação não convence nunca e soa como inveja; sua juventude estendida além do limite natural gerou uma máscara que, quando quer ser irônica, acaba figurando sarcástica – parece que vai envelhecer sem passar pela fase de maturidade. Sua dedicação às questões públicas destoa de sua trajetória personalista e é sempre uma derivação de seu desejo incontido de poder.

Desde que foi batido nas urnas, tomou como sentido de vida anular as eleições. Construir a oposição responsável, saldo maior e dever decorrente de sua votação expressiva, se afigura para ele como uma aceitação da derrota, o que conflita com sua autoimagem. 

Há uma necessidade premente de sustentação egoica que tromba com a realidade. Aécio vem tentando, por todos os meios, adiar a consagração de uma verdade democrática.

Sua presença na cena política brasileira vem somando ingredientes de golpismo explícito e irresponsabilidade difusa, por vezes até além das nossas fronteiras. Com isso, busca interromper um fluxo democrático que custou o trabalho de várias gerações. 

Para efetivar seu desejo de reescrever a história, vale-se de tudo, de fracos argumentos jurídicos encomendados ao moralismo típico da vertente antipopular e udenista da política brasileira, da qual é o representante extemporâneo mais expressivo.

Se a figura pública vem sendo suficientemente apresentada por suas atitudes, há um traço de caráter que aproxima Aécio de um personagem de romance do fim do século XIX. Quando, em 1891, o poeta irlandês Oscar Wilde publicou seu O retrato de Dorian Gray, sem querer, estava antecipando o destino trágico do senador mineiro.

Em linhas gerais, o livro narra a história de um homem que leva uma vida dupla. Por obra de um pacto, Dorian tem sua existência voltada para a busca do prazer sem limites. Mesmo assim, mantém a aparência do corpo e as cintilações da virtude, enquanto um retrato a óleo, pintado com sua imagem de corpo inteiro, envelhece e abriga as rugas do tempo e marcas de seus pecados de alma.

Dorian é ao mesmo tempo um esteta embriagado pela beleza e um homem capaz de atrocidades, sempre autoindulgente e feliz em se destacar das pessoas comuns. Ao final, imagem e realidade se encontram e selam seu destino. As cicatrizes do retrato colam de vez na pele de Dorian Gray, que é destruído por suas próprias ações.

Aécio Neves tem muito de Dorian Gray. O retrato que o protegeu do peso da realidade foi o fosso criado entre suas ações e a opinião pública.

Fez dos meios de comunicação, cooptados por vários expedientes, o verniz que imantava sua imagem pública. Equívocos e desvios não grudavam nele. Podia errar em administração, política, ética e até em bons modos, que saía ileso.

Assim, por força de uma ação operosa e cara de criação de sua imagem pública, o retrato midiático de Dorian Neves não exibia manchas de incompetência gerencial, descumprimento de responsabilidades legais, insensibilidade social, mitomania, amizades problemáticas, comportamento social extravagante, nepotismo e nem mesmo de contravenções simples, como dirigir fora das condições exigidas pelo Código de Trânsito Brasileiro.

Não era o político que errava, era seu outro, o retrato resguardado do olhar do público. O drama maior do personagem, contudo, era a crença na verdade da mentira. Aécio se convenceu de que era o Aécio que criou para uso externo.

Mas, como no caso de Dorian Gray, a tragédia se instalou. Hoje, pela força de seu personagem, não resta ao ex-governador nada além de manter o papel de vítima e vociferar contra a derrota que julga inaceitável.

Ele precisa atacar as eleições e o poder constituído, sem perceber que se aproxima da afronta à própria democracia. Está colada nele, agora para sempre, uma postura odiosa, iracunda, incapaz de diálogo.

Ele tem agora sua última chance: perseverar nas insensatas tentativas de golpe ou se despedir de vez de sua ambição de ser presidente da República. Daí o desespero, já que a cada dia suas chances diminuem. 

Seus correligionários José Serra e Geraldo Alkmin, como sempre “muito amigos”, acompanham o desbotar inevitável da falsa imagem enquanto, na sombra da discrição, aguardam 2018. Aécio Neves não deve chegar com musculatura política até lá. Ele está ficando cada dia mais desagradável.

Seu retrato, até então resguardado, foi descerrado em praça pública.

Talvez sobre a ele o aprendizado conquistado em tantos anos de dedicação ao prazer. É o quinhão de felicidade que ainda lhe resta.

Quando a vida dupla cessa, fica o solo humano verdadeiro, ainda que pouco fértil. Um personagem de O retrato de Dorian Gray define bem a Inglaterra vitoriana da novela: “a terra natal da hipocrisia”. O tempo passou, mas parece que não estamos muito longe dessa paisagem moral.


Postado no Brasil 247 em 15/07/2015