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Estupidez é a soma da burrice com a desumanidade


As cenas da expulsão, ao raiar do domingo, de seis mil pessoas da comunidade do Pinheirinnho, em São José dos Campos, são uma vergonha para este país.

Um vergonha, sobretudo, para o Judiciário que, como qualquer poder, está tão obrigado a cumprir a lei quanto a respeitar a diginidade de vidas humanas.
Não é possível que magistrados que reagem com tanto zelo em relação a si mesmos, inclusive na percepção de auxílio-moradia, não zelem por uma solução adequada à moradia – a única que têm – milhares de famílias pobres.
Havia, até ontem, uma contradição entre decisões da esfera estadual e federal, como registram os jornais. Era razoável esperar por uma decisão antes de uma medida de força, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo chegou a emitir ordem de enfrentamento à decisão da Justiça Federal que vigia, durante o dia,  para repelir “qualquer óbice que venha a surgir no curso da execução, inclusive a oposição de corporação policial federal”.
Com o devido respeito, é impensável que se possa dar uma ordem para que a Polícia Militar, garantidora da decisão estadual, enfrente a Polícia Federal, a quem competiria garantir a decisão de um desembargador federal.
Depois, a decisão do STJ, que revogou aquela decisão, só foi tomada à noite, depois de toda a operação. E se a decisão tivesse sido outra, o que justificaria aquela ação? Para a imobiliária, nenhum prejjuízo teria havido em esperar algumas horas ou dias.
Depois, tratava-se de uma situação de uma ocupação de longa data, oito anos, o que não é o mesmo que terem invadido ontem e terem montado barracas de lona. Havia ali casas, muitas de padrão bem aceitável, que consumiram muito do pouco que ganha aquela pobre gente e, sob qualquer ponto de vista, é um bem e merece alguma tutela.
Estava sendo buscada uma solução pelo Governo Federal. Não é possível que a massa falida da imobiliária do Sr. Naji Nahas não pudesse ser levada a negociar. Desapropiração, compra, permuta de terreno, havia uma série de possibilidades a serem tentadas antes de atirar à rua tanta gente.
Miguel Seabra Fagundes, a quem ninguém pode negar a honrade ter sido um dos maiores juristas deste país, na sua curta passagem pelo Ministério da Justiça, ajudou a impedir a remoção dos humildes moradores do Morro do Borel, na Tijuca, igualmente decretada por um juiz. E Seabra era um homem tão apegado a regras que demitiu-se por ter Carlos Lacerda invadido uma reunião ministerial para dar ordem a Café Filho.
Se o Poder Judiciário demonstrou um açodamento que não estamos acostumado a ver em suas ações, da mesma forma o Governo do Estado também não demonstrou prudência, porque mobilizar, num domingo de manhã, uma tropa de dois mil homens é, em qualquer corporação militar do mundo, uma proeza admirável.
Ninguém, em sã consciência, pode imaginar uma mobilização deste vulto sem a participação do comando da corporação e do próprio Governador do Estado. A força pública não é para ser usada sem medidas, nem de humanidade, nem de custo para a população. Muito menos seus homens devem ser brutalizados como estão sendo, quando passam a apontar espingardas para viciados na rua e moradores desesperados.
Ninguém está advogando o não-cumprimento de decisões judiciais, mas a forma e a velocidade que, em si, representam uma afronta ao principio da razoabilidade que estas devem ter.
Se a uma empresa falida, como a imobiliária de Naji Nahas, se concedem prazos e condições para que pague com seu patrimônio, as dívidas que não honrou, porque não se dar o mesmo direito às pessoas?
Ali estão 1.600 casas, 1.600 ex-lares, expostos ao saque, à depredação, e, amanhã, à demolição. Não são apenas partes de vidas, são riquezas construídas com trabalho honesto, que serão destruídas. Aproveitadas, urbanizadas, aquelas casas custariam menos que o problema que sua destruição coloca diante de todos e certamente menos do que a desapropriação da área, negociada.
A estupidez é só isso mesmo, a soma da burrice com a desumanidade.
PS. A área da remoção, ainda por cima,  tem uma história conturbada, que você pode ler no Paulo Henrique Amorim.
Postado por Fernando Brito no Blog Tijolaço em 23/01/2012

Se não fosse trágico seria cômico!


Sorria, você está sendo curado







Sei que estou comprando uma briga, e o faço em nome pessoal, sem sequer conversar sobre o assunto com o titular deste blog.
Porque jornalista que só escreve o que o chefe manda, é escriba, não jornalista.
Tão escandalizante quanto as declarações do sr. Dr. Laco, sem cedilha, chefe de política anti-drogas (?) do Governo paulista, de que usará “dor e sofrimento” como forma de levar os viciados em crack a buscarem tratamento, tão escandalizante quando a polícia paulista estar, esta tarde, atirando bombas contra os zumbis drogados que tentam voltar à Cracolândia é a falta de reação da “inteligência” paulistana e brasileira a este espetáculo dantesco.
Nós, que temos 50 anos, que convivemos na juventude  com a generalização da droga, que podíamos ou podemos ter um filho ou uma filha ali, doentes e consumidos por uma situação assim, estamos assistindo silentes a este espetáculo terrível.
Segundo a Folha, diz a própria PM que “havia, na cracolândia da rua Helvétia, 60 crianças e 20 grávidas”.
É a eles, inclusive, que queremos impingir “dor e sofrimentos”, além de bombas?
Não vemos a OAB, o Sindicato dos Médicos, ninguém levantando a voz contra o fato de, segundo os próprios jornais, a dispersão dos viciados da Cracolândia estar sendo feita essencialmente com porretes – e digo que, aí, os policiais são até os menos culpados, porque eles próprios sabem que isso é uma pantomima – e não com assistência médica e social.
Os viciados da cracolândia podem agir como bichos irracionais, porque estão corroídos por uma dependência que lhes tira a razão e a ponderação. Nós é que não temos o direito de agir como bichos.
Muito menos se essa ação espalhafatosa é puro marketing, destinada a cenas no Jornal Nacional que produzam imagem de um “combate à droga”  que é, antes, promoção da imagem da “autoridade” do que um ataque real ao problema.
Uma sociedade à qual falta a compaixão, à qual o medo de dizer que aquilo que fere a dignidade humana jamais pode ser feito por ninguém, mas muito menos pelo Estado, que a todos nos representa está mais doente do que aqueles pobres drogados.
Porque nós estamos lúcidos e sabemos discernir o certo do errado.
Ou não sabemos mais? Ou não somos mais viciados em  amar o próximo?

Postado por Fernando Brito no Blog O Tijolaço em 05/01/2012